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quarta-feira, 28 de janeiro de 2009
28 de janeiro de 2009
N° 15862 - PAULO SANT’ANA
O bebê emborcado
Esses dias, fiz uma coluna afirmando que o acaso preside as nossas vidas.
Não tenho dúvida nenhuma sobre isso. Todos nós somos fruto do acaso. Tanto que eu não existiria se meu pai não tivesse tido o impulso de ir naquele baile, no distante ano de 1938, em que conheceria a minha mãe.
Se eu não tivesse vindo, no distante ano de 1971, até a redação de Zero Hora, não sei para fazer o que, se naquela ocasião o Cândido Norberto não tivesse me convidado para falar no microfone do Sala de Redação, um convite absolutamente sem propósito, eu não teria me tornado jornalista de rádio, jornal e televisão.
Minha vida se transformou completamente depois que aceitei o convite do Cândido.
Se eu não estivesse passando no corredor do jornal quando o Cândido me avistou, outra pessoa estaria agora escrevendo esta coluna, minha vida teria tomado uma outra qualquer direção que não esta por onde enveredei.
Assim como a vida do leitor ou leitora que está me lendo. Toda a sua vida, praticamente toda, foi determinada pelo acaso.
Se Barack Obama não tivesse sido abandonado pelo pai queniano, não seria hoje presidente dos EUA.
Se Lula da Silva não tivesse embarcado naquele pau-de-arara, há 50 anos, no distrito de Caetés, município de Guaranhuns, não seria hoje presidente da República.
Se aquela pombinha, da qual não me esqueço, não tivesse ido para a beira do lago do Parcão, com o fim de especular petiscos, não teria sido apanhada pelas maxilas daquele cágado que abocanhou o seu pescoço.
Todos os passos decisivos da nossa vida são decididos pelo acaso.
Para o bem ou para o mal.
Parece que Deus criou os homens e jogou-os no mundo para serem administrados pelo acaso.
Mais uma obra fatal do acaso, com impressionantes tinturas, nos é dada a conhecer pelos jornais: um bebê de 11 meses, na Vila Operária, em Passo Fundo, morreu afogado num balde.
É tragicamente intrigante.
Quantos milhares de bebês não morreram nas inundações recentes no Vale do Itajaí, para que um bebê morra afogado num balde em Passo Fundo?
É fácil imaginar como se afogou num balde esse bebê. Recém estava aprendendo a caminhar, passeava pela sala onde havia um balde cheio de água.
É obsessivo nos humanos a procura pela água, tanto que no verão 1 milhão de gaúchos se dirige para o Litoral e outro milhão se refocila nas águas dos rios, dos riachos e dos arroios.
E o bebê foi tentar brincar com a água do balde, uma água que o refrescasse do tórrido verão.
É bem provável que esse bebê tivesse se aproximado do balde e se inclinado para beber a água.
E, ao inclinar-se, emborcou no balde.
O acaso fez o menino andar por uma peça da casa enquanto a mãe dava banho em seu irmão gêmeo noutra.
Por que não era o outro irmão que estava na peça do balde? O acaso.
O acaso também fez que o balde não virasse quando o menino emborcou nele.
E imagino a cena patética do bebê com a cabeça no fundo do balde, esperneando, sem ninguém prestar-lhe socorro.
Uma tempestade em copo d’água.
Não foi num tanque, não foi numa piscina, no que o menino se afogou. Foi num balde.
O acaso é sem dúvida o personagem principal do teatro da vida.
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