domingo, 18 de janeiro de 2009


ELIANE CANTANHÊDE

Lula lá, Lula cá

BRASÍLIA - No Brasil, Lula anuncia que retirou o aval à emenda que acaba com a reeleição, deixando a impressão de que desistiu definitivamente do terceiro mandato e a avaliação óbvia de que o alvo é o PSDB, onde a emenda acomoda os interesses de Serra e de Aécio.
Lá na Venezuela, o papo é outro.

Ao fazer campanha aberta a favor dos mandatos múltiplos para Chávez, a um mês do plebiscito sobre a questão, Lula defendeu a tese de "três, quatro reeleições", como nos parlamentaristas Espanha, Alemanha e Reino Unido.

Apesar de insistir que não vai cair na tentação, Lula usou uma argumentação enviesada. Vejamos.

Alegou que é a favor da reeleição infinita de Chávez e não da própria, pela idade: "O Chávez é novo ainda, aguenta um novo mandato. Agora eu já tô velho, vou me retirar". Como comparação: Lula tem 62 anos, Dilma, 61, e Serra, 66. Quem é "velho" para mais um mandato?

Outra argumentação: "Na hora que você tiver instituições consolidadas e tiver a liberdade política que o povo quiser, isso [reeleições sucessivas] vai acontecer". Como comparação: será que as instituições brasileiras estão menos consolidadas do que as da Venezuela? E o povo brasileiro tem menos liberdade política para decidir?

Lula, pois, continua brincando de gato e rato com a re-reeleição. Diz que não quer, mas deixa o PT tocar adiante no Congresso. Tira a emenda que possibilitaria a mudança, mas faz uma defesa pública em solo estrangeiro. Argumenta contra, recorrendo a argumentos a favor.

É assim que ele vai brincando, brincando... e sentindo a reação. Se realmente cumprir a palavra, vai de Dilma e esfrega na cara de adversários e de colunistas: "Viu, não disse?".

Se colar, ele saca suas declarações pró-Chávez para alegar "coerência". E lembra: ele tem idade, as instituições estão consolidadas, e o povo tem liberdade.
É brincadeira com coisa séria.

elianec@uol.com.br

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