sábado, 31 de janeiro de 2009



31 de janeiro de 2009
N° 15865 - PAULO SANT’ANA


Um acordo óbvio

Quando o tema é hospital público, eu me agito e fico alerta.

Acontece que o Ministério Público Federal, através das procuradoras da República Ana Paula Carvalho de Medeiros e Suzete Bragagnolo, ajuizou uma ação civil visando a que o Hospital de Clínicas de Porto Alegre dedique 100% dos seus leitos e o total dos seus procedimentos médicos ao Sistema Único de Saúde.

Elas destacam na ação que, no setor de radiologia do hospital, muitas vezes os pacientes do SUS podem levar de seis a oito meses para serem atendidos. E que a realização de uma cirurgia eletiva chega a demorar anos para sua concretização.

É que o Hospital de Clínicas reserva parte de sua capacidade para atendimento de pacientes particulares e de convênios privados.

As procuradoras argumentam que o privado serve-se da estrutura do hospital público, que é custeado por quantidade superior de recursos públicos.

Em nota publicada quinta-feira aqui em ZH, com letrinhas muito pequenas, pelo que dou mais realce agora nesta coluna, a direção do Hospital de Clínicas contra-argumenta que apenas 11% dos leitos são destinados aos convênios, entre os quais o IPE e outros subsidiados por recursos públicos, o que em nada prejudica o atendimento pelo SUS.

Pelo contrário, acresce a direção do HCPA, o atendimento aos convênios gera uma receita que financia o atendimento do hospital excedente ao limite máximo imposto pelo SUS.

Alega a direção do Clínicas que o hospital atende o SUS em mais que os 100% contratados, chega a 113% nos atendimentos de média complexidade, 286% nos atendimentos laboratoriais, 210% na radiologia, 127% na quimioterapia, 106% na hemodiálise e 107% nas consultas.

Em outras palavras, o Clínicas atende o SUS em mais do que lhe compete por contrato, em razão justamente da receita que obtém com o atendimento de apenas 11% de sua capacidade para os convênios.

Comovem-me vários dados deste embate judicial. Um deles é que entre os conveniados que são atendidos pelo Clínicas está o IPE, que praticamente é o mesmo que o SUS, com a única diferença de que os associados são ou foram servidores públicos.

Eu não gostaria de ver os sacrificados associados do IPE sem atendimento no Clínicas.

Tocou-me também que as procuradoras tenham citado que há uma demora de seis a oito meses para um exame radiológico no Clínicas. Isso não é aceitável.

E finalmente me comoveu que o Clínicas, como a Santa Casa, tenha inteligentemente ido se valer dos recursos que aufere atendendo aos convênios para destiná-los em primeira e última análise para o melhor atendimento dos pacientes do SUS. Isso é precioso e tem de ser respeitado.

Mas também é respeitável a ação que intenta o Ministério Público Federal.

É neste instante que esta coluna pede licença para mediar o conflito, cuja decisão é vital para a saúde pública gaúcha.

É imprescindível que as duas partes entrem em um acordo pelo qual o Hospital de Clínicas continue ocupando somente 11% dos seus leitos destinados aos convênios, portanto 89% destinados ao SUS, desde que cumpra as exigências do Ministério Público Federal no que se refere a zerar a demora nos exames radiológicos, obrigando-se a atendê-los num prazo máximo de 15 dias, alargue um pouco mais o atendimento cirúrgico, de forma a aliviar a imensa fila que há nesse aspecto no SUS.

Em suma, pelo acordo entre as duas partes, que pode ser celebrado no juízo federal competente, o Clínicas não perde seu atendimento aos convênios, o que, se ocorresse, significaria o seu sucateamento, segundo sua direção argumenta – e o Ministério Público Federal veria sua exigência de que sejam alargados os atendimentos do hospital pelo SUS atendida.

Este conflito está clamando por um entendimento.

Espero que as partes e a Justiça Federal o celebrem.

É vital e imperioso para a saúde pública gaúcha que o celebrem.

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