terça-feira, 20 de janeiro de 2009



TEMPO DE METAMORFOSE

Agora é que são elas. Barack Obama sai do conforto da situação de presidente eleito para o desconforto de quem terá de mostrar muito serviço. Termina o símbolo e começa a realidade total.

Os mais otimistas apostam que será o início do mito. Os pessimistas, que se têm por realistas bem-informados, sorriem. Para eles, a fase do marketing está com os dias contados. Como dizia o poeta, há um tempo para semear e um tempo para o rato silvestre sair da toca.

Os Estados Unidos podem mostrar ao planeta que são capazes de exercer o poder com generosidade. Quer dizer, com a fatia de generosidade que o poder pode comportar sem contrariar a sua natureza. Uma prova de que isso é possível já se deu com a eleição de Obama, o primeiro negro a tornar-se presidente da potência global.

Obama assume com problemas para resolver à altura do entusiasmo que sua eleição gerou: crise econômica internacional, conflito no Oriente Médio e abalo no credo capitalista da não-intervenção estatal na economia.

A nova lei do mercado é paradoxal como deve ser uma lei com pretensões universais: só não merece salvação estatal quem é incapaz de provocar grandes estragos. Citibank e Bank of América passaram no teste.

Edgar Morin, 87 anos, judeu que resistiu de arma na mão ao nazismo, talvez o mais visionário e brilhante intelectual em atividade no mundo, publicou no ano passado um artigo com a sua marca registrada: catástrofe ou metamorfose?

A complexidade mora nessa eterna ambivalência: a morte produz vida, que vive de morte. A crise renova. A renovação traz novas crises. A mudança alimenta-se de competência e símbolos.

Às vezes, um líder tem competência técnica, mas não possui carisma. Falta-lhe a competência simbólica que mobiliza o imaginário das pessoas. O oposto também ocorre. Barack Obama chega ao poder em meio a catástrofes. A crise econômica atual é vista como a maior desde 1929. O abismo da intolerância não cessa de crescer. Há certa sensação de fracasso no ar.

Obama está legitimado por um extraordinário 'capital simbólico'. Ele representa um impossível tornado possível. É por isso que, se tiver também a competência técnica imaginada ou desejada por todos, poderá fazer da catástrofe um princípio, ao menos, de metamorfose.

Há muito que um presidente americano não despertava tanta empatia. Pieguice? Racismo às avessas? Ilusões renovadas? Não. Obama encarna para quem nele tem esperança a certeza já concretizada de que os preconceitos podem ser superados e os obstáculos vencidos. É o símbolo que vence o real.

Instaura-se um novo imaginário. Como se sabe, porém, desde Maquiavel, o mais difícil não é alcançar o poder, é mantê-lo. Ou exercê-lo com sabedoria. A partir de agora, a população cobrará do seu símbolo resultados concretos. Cabe-lhe a modesta tarefa de dar novo alento ao capitalismo e melhorar a estima dos investidores.

Talvez um bom começo seja introduzir uma inovação na linguagem dos liberais. Ensiná-los a nunca mais dizer que o Estado deve se manter longe do mercado. Podem, por exemplo, afirmar que o Estado deve ficar fora da economia sempre que estiver tudo bem.

A isso poderia se chamar de transparência. Personalidade e atitude não faltam a Obama. Chegou a hora de plantar e colher ao mesmo tempo. A metamorfose entra em campo para fazer limão em limonada. Ou, por que não?, em uma boa caipirinha. Opa, acho que me enganei de símbolo. Sem preconceitos!

juremir@correiodopovo.com.br

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