terça-feira, 20 de janeiro de 2009



20 de janeiro de 2009
N° 15854 - MOACYR SCLIAR


Esperando Barack Obama

Na peça Esperando Godot, Samuel Beckett mostra-nos dois personagens, Vladimir e Estragon, à espera de alguém chamado Godot, que nunca aparece, o que cria um clima surrealista e motivou muitas interpretações.

Segundo uma delas, o nome Godot seria formado do inglês God, Deus, mais o diminutivo francês (idioma no qual a peça foi originalmente escrita; irlandês, Beckett vivia, contudo, na França), uma interpretação que o autor não endossava. De qualquer modo, Godot tornou-se o símbolo de uma figura messiânica, de uma espécie de salvador.

Uma imagem que é impossível não lembrar no dia em que Barack Obama toma posse como presidente dos Estados Unidos. A expectativa é enorme, e não apenas por parte dos americanos que votaram nele.

O mundo todo está de respiração suspensa. Obama, espera-se, vai recuperar a economia dos Estados Unidos e a economia mundial, vai trazer a paz, vai acabar com Guantánamo e com o bloqueio a Cuba, vai erradicar de vez os preconceitos. Em suma, será não apenas um presidente, mas um verdadeiro deus, ou, no mínimo, um Papai Noel.

Muitos dirão que o Natal já passou, que 20 de janeiro não é 25 de dezembro. Certo. Mas viver é ter esperança, algo que não podemos, e não devemos, perder. Não por acaso, Dante colocou na entrada do Inferno o verso famoso: “Deixai toda a esperança, ó vós que entrais”.

O Inferno é isso, é a perda de toda aspiração em relação ao futuro. Há, contudo, dois tipos de esperança, a esperança fundada e a esperança infundada, a esperança certa e a esperança errada.

Disto o Brasil pode dar muitos exemplos, o mais recente sendo o de Collor, o caçador de marajás, o mandatário que ia acabar com a inflação, com a corrupção e com todos os males no Brasil.

Não acabou com nada disso, e o povo é que teve de acabar com ele, na campanha pelo impeachment. Estes erros são inevitáveis e, em certa medida são úteis, pois graças a eles a democracia se aperfeiçoa.

O que caracteriza a esperança certa? Em primeiro lugar, ela é realista, não espera por milagres (“milagre brasileiro” foi uma expressão muito ouvida em certo momento da ditadura). No caso da situação da economia, por exemplo, as coisas não vão mudar da noite para o dia. Mas se o governo de Obama der os primeiros passos na direção adequada, já será um grande avanço.

Em segundo lugar, a esperança certa é aquela que manifesta uma disposição, não apenas uma crença mágica. Não é a esperança que diz para um líder: “Leva-nos a tal lugar”. Não, é a esperança que diz: “Nós vamos juntos para tal lugar”. É a esperança de quem sabe onde quer ir, sabe qual o caminho a tomar, de quem está disposto a fazer força para conseguir os objetivos.

Até agora, Barack Obama mostrou-se um líder sóbrio, seguro de si próprio. Não é um demagogo, não é um visionário. Aparentemente dá-se conta do tamanho do problema que tem pela frente, um problemão para dizer a verdade.

Não se ilude; sabe que não será fácil, mas também não desanima. A cena de TV que mostrou-o, ontem, ajudando a pintar uma escola, é simbólica.

Presidentes não raro só revelam o que são depois que assumem o poder. E aí de repente aparece o demagogo, o fanático, o louco, até; mas também aparece o pragmático, o realista.

Lula, por exemplo, surpreendeu; Sarkozy surpreendeu também. Surpresas que podem ter sido desagradáveis para alguns, ou com aspectos desagradáveis para alguns, mas que no conjunto revelaram-se positivas.

Se Obama tiver de nos surpreender, que seja para o bem, para que o mundo não se sinta como Vladimir e Estragon. Talvez o erro deles tenha sido não votar em Barack Obama, bem-vindo seja.

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