quinta-feira, 25 de setembro de 2008



25 de setembro de 2008
N° 15739 - LUIZ PILLA VARES


A nossa Clara

No último dia 9, morreu Clara Maria Scott da Silva.

Era uma negra esguia e elegante na sua simplicidade autenticamente proletária. Foi uma militante política sem ambições de fazer carreira no partido ao qual aderiu e se dedicou a vida inteira. Era o que chamamos uma “militante de base”, que permaneceu toda a vida num anonimato digno.

Ainda há gente assim, gente que coloca sempre em primeiro lugar a luta pela cidadania, a coerência na opção que fez por toda uma vida.

Não havia caminhada de seu partido sem que ela estivesse lá, orgulhosa de sua bandeira. E, quando era preciso, não olhava para o relógio: ficava sempre à disposição.

Durante as eleições partidárias, era sempre a primeira a se apresentar como voluntária para ajudar na infra-estrutura do processo, distribuindo senhas, marcando a lista de presenças, ajudando onde fosse necessário, sem nunca reclamar de cansaço.

Prezava a vida e seus prazeres, mas tinha plena consciência do significado de uma opção cidadã, que vinha sempre em primeiro lugar. E assim foi até o fim de seus dias.

Clara não fazia parte nem da intelectualidade partidária, nem de qualquer grupo dirigente, mas tinha as suas opiniões, às vezes ingênuas (eu muitas vezes a tratava carinhosamente de “Velhinha de Taubaté”, e ela aceitava sem reclamar, pois sabia que ali não estava embutida nenhuma malícia ou desprezo presunçoso), e era coerente com elas.

Mesmo assim, ou talvez por causa disso, era querida por todos os seus companheiros de militância.

Outra de suas paixões era o samba: gostava do Carnaval e não se incomodava em viajar ao Rio de Janeiro para desfilar pela Mangueira de seu coração:

“Tá no sangue”, disse-me certa vez, e lá se foi para o Rio e para a Mangueira com a mesma paixão com que participava das caminhadas políticas, vestindo a sua fantasia verde-e-rosa tão orgulhosa como quando andava pelas ruas de Porto Alegre com a bandeira de seu partido, do qual nunca duvidou nem pensou em abandoná-lo um dia sequer.

Quando Clara Scott morreu eu estava adoentado, trancado em casa, e não pude ir a seus funerais.

Assim, esta coluna quinzenal toma a liberdade de homenageá-la e rasgar um pouco a cortina de anonimato que cercou a sua vida militante e abnegada.

Clara, a nossa Clara, deixará, porém, saudades em uma vasto círculo de militantes políticos que ainda não perderam a esperança, como ela, em uma sociedade mais justa e mais humana.

Um comentário:

Anônimo disse...

Certamente neste domingo turvo, das eleições em Porto Alegre, a Clarinha está fazendo falta... mas deve estar acompanhando tudo de algum outro lugar. Saudades, Clara!!!