sexta-feira, 12 de outubro de 2007


Editorial Folha

Cai Renan Calheiros

Senador sai de um cargo que já não tinha como exercer; episódio deixa rastro de desmoralização na política brasileira

ENFIM. Um Renan Calheiros abatido anunciou, na noite de ontem, a decisão de licenciar-se da presidência do Senado. Não era outra a expectativa da opinião pública -e, nos últimos tempos, a dos próprios senadores da base governista-, depois de assistir a tão longo processo de desgaste.

Teria sido mais simples, pode-se pensar agora, se Renan Calheiros tivesse resolvido afastar-se do cargo tão logo surgiram as primeiras denúncias a seu respeito. Apostou, entretanto, na conivência de seus pares, na própria capacidade de intimidar os adversários mais renitentes, e nas condições de manipulação que o cargo lhe oferecia.

Deve-se notar que a aposta, a princípio, não teria como lhe parecer equivocada. Foi a maioria dos senadores, em votação secreta, quem lhe deu respaldo para continuar no poder. A indignação da sociedade diante daquele veredicto não teve nenhum impacto sobre seu comportamento.

Num efeito paradoxal, a confiança de Renan Calheiros nos próprios métodos crescia na medida mesma em que se acumulavam novas denúncias contra seu nome.

Enquanto alguns de seus aliados do Partido dos Trabalhadores tentavam pateticamente salvar a própria imagem do estrago causado pela farsa da absolvição sigilosa, o presidente do Senado retirou daquele episódio mais forças -e mais certeza de impunidade- para enfrentar as sucessivas revelações a seu respeito.

A impunidade não era, contudo, sinônimo de poder.

De certo ponto de vista, em todo o caso Renan Calheiros deu-se como que o enfrentamento entre dois modos de se encarar a política.

Ou se trata de um jogo corporativo, em que lobistas, laranjas, parentes e correligionários se articulam para manter-se no usufruto do poder, ou se trata de uma atividade de representação pública dos diferentes interesses da sociedade, na qual todo parlamentar ou governante está forçado, permanentemente, a prestar contas de seus atos.

A última denúncia envolvendo o senador Renan Calheiros -a de que teria articulado um virtual mecanismo de espionagem contra dois de seus adversários no Congresso Nacional- parece simbolizar, tanto quanto a sessão secreta de que saiu absolvido, o predomínio daquela concepção sombria, anti-republicana e arcaica de se fazer política.

Seria injustificável otimismo considerar, porém, que o afastamento de Renan Calheiros represente uma conquista no que tange à modernidade e à transparência institucional no país. Ao contrário, se alguma lição resulta do caso, foi a da extrema resistência da maioria do Senado diante das pressões da opinião pública.

Para que Renan caísse, foi necessário que sua presença passasse a ser vista, por alguns senadores, como fonte de ameaça e de chantagem; e, pelo Planalto, como fonte de distúrbios na aprovação da CPMF.

Renan Calheiros afasta-se de um cargo que já não tinha como exercer; o rastro de desmoralização que todo o episódio deixa na política brasileira, entretanto, não desaparece com ele.

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