segunda-feira, 14 de agosto de 2023


12 DE AGOSTO DE 2023
CRISTINA BONORINO

O NOVO OURO

A pergunta hoje não é mais se você trocaria ouro por colares de vidro, mas sim se você sabe reconhecer o novo ouro. Que commodity você acha que hoje tem mais valor - mundialmente? E quanto ela vale?

Olhe ao seu redor. Tudo o que você usa, o que você consome, chega até você de maneira direcionada. Através de inteligência artificial, IA. Algoritmos estudam seus dados e te oferecem serviços e produtos - nas redes sociais, nos serviços de streaming, nos sites de busca e mesmo de compra direta. Muita gente não sabe por que recebe determinadas sugestões - aparentemente sem sentido. É que os modelos de IA precisam "estudar" e "aprender" - o chamado aprendizado de máquina.

Cada vez que você clica em algo, os modelos aprendem. Quanto mais dados o modelo estuda, mais ele aprende, melhor e mais eficiente ele se torna para fazer previsões. Então, uma só pessoa gera um monte de dados que, para quem domina ferramentas de IA, vira riqueza. Mas agora imagine o quanto de dados gera uma empresa. Ou ainda, imagine um hospital. Ali não são gerados dados simples - trata-se de uma quantidade inimaginável de informação produzida por todos os que ali trabalham. 

Por exemplo, seu histórico de vida, de doenças, da sua família, seus exames de imagem, suas respostas a medicamentos diversos, sua recuperação de uma cirurgia. Imagine a pesquisa gerada por uma universidade, ou 10, ou cem. Dinheiro investido do governo e de empresas para gerar informação nova, pagando salários, insumos, máquinas, energia. Todos esses dados hoje podem ser minerados por quem tiver as melhores ferramentas.

O que poucos sabem é que existem bancos de dados públicos e bancos privados. Você pode hoje patentear um banco de dados e cobrar o acesso - gerando mais riqueza. Mas para onde vai essa riqueza? Então, um debate fundamental é como gerir o acesso aos dados. Tudo deve ser público? Ou tudo privado? Ou cada instituição poderia estabelecer uma curadoria dos dados, liberando o acesso mais livre a um pesquisador, por exemplo, de uma universidade pública, mas cobrando de um Musk ou Zuckerberg? E se o acesso for cobrado, como tornar transparente o reinvestimento desses recursos?

Como ocorre, por exemplo, no FNDCT, Fundo Nacional de Desenvolvimento de Ciência e Tecnologia, estabelecido com impostos de empresas de ciência e tecnologia para financiar pesquisa. Alguns bancos de dados, como os do Massachussetts Institute of Technology (MIT), tem curadoria para acesso. A maioria dos dados do MIT vêm da população de países desenvolvidos - muito diferentes em hábitos, culturas, genética. Os modelos de IA treinados nesses bancos têm alcance limitado. Mas, treinando com dados que representem a diversidade de um planeta, seu poder e eficácia podem alcançar níveis ainda inimagináveis.

Aos gestores de instituições públicas e privadas do Brasil, cabe hoje uma escolha definitiva. Ou investir em curadoria de dados e treinamento de pessoal especializado em IA protegendo a riqueza nacional; ou entregar aos bandidos todo o ouro que conseguirem carregar, condenando o país a ser um eterno fornecedor de commodities.

CRISTINA BONORINO

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