Jaime
Cimenti
Freud foi responsável pela morte da
irmã?
A
irmã de Freud, romance do professor, dramaturgo e escritor macedônio Goce
Smilevski, nascido em 1975, foi vencedor do Prêmio da União Europeia para a
Literatura e marca a estreia do autor no Brasil. O romance já foi publicado em
mais de 30 idiomas.
Quando
foi lançado, chocou os leitores, que se perguntavam se Sigmund Freud, o famoso
criador da psicanálise e uma das maiores personalidades do século XX, teria
sido responsável pela morte de sua irmã em um campo de concentração nazista. O
relato de Goce é ficcional, mas, apesar do caráter de fantasia, a premissa da
obra é verdadeira: Freud fugiu da Áustria em plena ascensão nazista deixando
quatro irmãs para trás. Todas morreram em campos de concentração.
Na
Viena ocupada pelos nazistas, Freud recebeu o direito de fugir para o exterior
levando consigo alguns entes queridos. Na lista, entram a mulher, os filhos, a
cunhada, duas assistentes, o médico pessoal com sua família e até o cachorro,
mas não as quatro irmãs idosas: Marie, Rosa, Pauline e Adolfine. Adolfine,
deportada para o campo de concentração de Terezin, é quem relembra o episódio
com dolorosa mágoa.
Smilevski
descreve, com maestria e detalhes, a trajetória de Sigmund Freud, com destaque,
obviamente, no romance, à narradora, Adolfine. Pelas palavras da irmã, os
leitores vão entrar em contato com a intimidade do famoso psiquiatra, suas
fraquezas e como ele se relacionava com os parentes.
Desde
a infância, Adolfine foi próxima do irmão, seu mentor. Depois, na fase adulta,
veio o distanciamento e a sombra trágica da separação final. A narrativa trata
da cosmopolita Viena na virada do século XIX para o século XX, descrita por
Adolfine, sem marido, sem filhos, e cuja mãe a considerava uma inútil.
Adolfine
era apenas a irmã de um gênio totalmente absorto na construção do próprio mito
de novo profeta, destinado a libertar a humanidade das falsas crenças de que se
alimentou durante séculos. Esquecida nas sombras da história, a irmã de Freud
revive relações familiares gélidas, um amor trágico, o sonho não realizado da
maternidade e a aceitação de encontrar a paz apenas no esquecimento
tranquilizador de uma loucura autoimposta.
No
romance, há também um intenso debate sobre teorias psicanalíticas, mostrando
como elas não eram seguidas pelo próprio criador. Loucura, felicidade e sentido
da vida estão enfocados na narrativa, especialmente numa inteligente discussão
entre os protagonistas. Ousado, imaginativo, profundo e provocante são alguns
dos adjetivos que a crítica usou para caracterizar a obra. Bertrand Brasil, 334
páginas,
mdireto@record.com.br
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