29
de dezembro de 2013 | N° 17658 VERISSIMO
As
aventuras da família Brasil
Vô sério
O
vovô era um homem sério. Não carrancudo, mas sério. Tanto que os netos fizeram
uma aposta: ganharia quem fizesse o vovô rir. O local da competição seria a
mesa do almoço, aos domingos, quando toda a família se reunia, com a vovó numa
cabeceira e o vovô na outra. Foram estabelecidas certas regras. Para ganhar,
seria preciso provocar uma gargalhada no vovô. Um sorriso não bastaria. O
objetivo era uma risada. Ou para não haver duvida do que se buscava uma BOA
risada.
Algumas
dúvidas tiveram que ser esclarecidas antes de começar a disputa.
—
Cócegas vale?
Ninguém
imaginava que o vovô sentisse cócegas, mas, de qualquer maneira, cócegas foram
vetadas. E anedota? Se o vovô risse de uma anedota, a vitória seria do contador
ou da anedota? Decidiram permitir anedotas. Quem soubesse contar uma anedota
tão bem que fizesse o vovô dar uma risada, uma BOA risada, mesmo que não fosse
seu autor, mereceria ganhar.
No
primeiro domingo depois da aposta o Marquinhos – segundo o consenso geral na
família o mais palhaço dos netos – sentou-se à mesa fantasiado de mico, fazendo
ruídos e gestos de mico e pedindo banana. Todos riram muito – menos o vovô. O
vovô disse: “muito engraçado, Marquinhos. Agora tire essa roupa e coma
direito”. Mais tarde o Marquinhos argumentaria que o vovô dizer “muito
engraçado” equivalia a uma risada, mas seu protesto foi ignorado.
No
domingo seguinte, o Eduardinho contou uma anedota.
—
Sabem aquela do cara que tirou uma radiografia e o médico disse que ele
precisava ser operado? O cara perguntou quanto custaria a operação e o médico
deu o preço. O cara achou muito e perguntou quanto custaria um tratamento sem
precisar operar. O médico deu o preço, que o cara também achou muito. Aí o
médico disse: “se o senhor preferir, pela metade do preço, eu retoco a
radiografia”.
Todos
riram muito - menos o vovô. O vovô disse que aquela história envolvia questões
muito sérias, como a saúde de um ser humano e a ética médica, e não era assunto
para ser tratado na mesa, na frente das outras crianças. O Eduardinho
protestou:
—
Era uma anedota, vovô.
—
Muito sem graça - disse o vovô.
Nas
semanas seguintes, todos os netos tentaram, de um jeito ou de outro, fazer o
vovô rir. Apelaram para mímica, imitações (o Tico fazia um Silvio Santos
impagável), números musicais, concurso de quem chupava o espaguete mais
ligeiro, tudo. E o vovô sério. Finalmente desistiram.
E no
último domingo aconteceu o seguinte: a vovó sentou-se na sua cadeira na
cabeceira, depois de trazer a travessa de frangos da cozinha e colocá-la sobre
a mesa - e caiu da cadeira. E o vovô explodiu numa gargalhada. Uma BOA risada
que não parava mais, enquanto a vovó era atendida e dizia que estava bem, que
não tinha se machucado, que não se incomodassem com ela.
Depois
houve controvérsia. Uns netos achavam que a vovó cair da cadeira tinha sido
mesmo um acidente, outros achavam que a vovó tinha caído de propósito. Depois
de tantos anos, sabia o que faria o vovô rir e dera uma mãozinha para os netos.
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