30
de dezembro de 2013 | N° 17659
ARTIGOS
- Paulo Brossard*
O Julinho e o ensino
Artigos
Um
fato chocante e de inegável importância social foi divulgado por ZH dias antes
do Natal ao retratar a alarmante deterioração de um dos mais conceituados
colégios de Porto Alegre, o Julinho, como era familiarmente denominado o Julio
de Castilhos. Ao tempo em que surgiam colégios de inspiração religiosa, logo
consagrados pela excelência do ensino ministrado por notáveis educadores, o governo
rio-grandense, de forte tintura comtiana, cuidou de formar seu colégio padrão,
que viria a levar o nome do chefe republicano; cansei de ouvir referências
respeitosas ao colégio laico destinado a cotejar com os católicos e
evangélicos; o maior louvor suponho viesse daquele que o houvessem frequentado.
O
trabalho da jornalista Letícia Duarte estendeu-se pelo ano escolar, de 27 de
fevereiro a 22 de novembro de 2013; registrando o colapso do que fora um
colégio modelar; é impossível resumi-lo, o espaço seria insuficiente para um
resumo do resumo, limito-me a dizer que, a todos os títulos, o quadro é
deplorável.
É
óbvio que sem professor não há escola nem ensino, no entanto, no Julinho, até
sete professores por dia faltam às aulas, 89% dos alunos chegam ao final do
Ensino Médio sem aprender o mínimo em matemática, 38% saem do Ensino Médio e
chegam ao Superior e não sabem ler e escrever plenamente; ao fundo da sala,
alunos se divertem com equipamentos eletrônicos durante as aulas; essas
singelas observações esclarecem por que a classificação do Brasil entre 65
nações ocupa posição desoladora. É de notar-se que isto acontece em um colégio
que durante muitos anos foi dos melhores aqui existentes e em consequência no
Brasil inteiro. Esta metamorfose não se operou de repente, o mal, por
conseguinte não começou ontem.
O
colégio que foi o melhor não se transforma no pior da noite para o dia. E o
mais grave é que a degradação se infiltra a setores relevantes do país, do
governo inclusive a de instituições docentes. Dir-se-á que existem, Deus seja
louvado, colégios da melhor e mais justificada reputação e eu sei disso e como
brasileiro por isto me felicito, mas infelizmente isto não justifica a cota de
colégios de inqualificável reputação. Segundo as repercussões até agora
conhecidas, verifica-se que há os que pensam que o fenômeno que deformou o
Julinho tem caráter geral e há os que entendem que a falência do antigo e
modelar ornamento do colégio oficial é uma exceção.
Não
tenho elementos para opinar em favor de uma ou outra das interpretações, mas
confesso a minha angústia cívica diante do espetáculo público do caso funesto e
vexatório do Julinho, uma vez que os efeitos dele se irradiam aos demais graus
do ensino; é evidente que o ensino primário contamina o Ensino Médio e este
compromete o Ensino Superior; a esse respeito, louvores seriam poucos, se as
numerosas universidades emergentes realmente encarnassem o que a sua
denominação anuncia. Também neste caso me confesso sem condições de opinar em
assunto de tal relevância, pois não conheço o real teor do ensino oferecido e,
mais do que o ensino, da real formação de seus jovens frequentadores.
No
entanto, há um dado idôneo que ajuda a esclarecer o problema em causa, não é
segredo, foi amplamente divulgado que dos 65 países que participam do exame de
avaliação internacional de alunos de 15 e 16 anos em várias áreas ficou o
Brasil na 55ª posição em leitura, 58ª em matemática e 59ª em ciências.
Dispensável dizer que esses dados indicam as carências do ensino no Brasil. Os
dados referidos são dolorosos para não dizer humilhantes. O caso do Julinho soa
como uma espécie de S.O.S. partindo da educação.
*JURISTA,
MINISTRO APOSENTADO DO STF
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