20
de dezembro de 2013 | N° 17650
DAVID
COIMBRA
Viva a mediocridade
A
democracia é um péssimo sistema de governo. É lento, é ineficiente. Pena que é indispensável.
E é indispensável por um só motivo: porque não existe outro antídoto contra a
tirania. Nas democracias, mesmo nas incipientes, os governos se renovam com
periodicidade, e nas democracias maduras o povo tem espaço para expressar o que
não quer.
Aí está
algo que o povo de uma democracia evoluída tem competência para fazer: expressar
o que não quer.
Expressar
o que quer é mais complicado. As pessoas não sabem o que querem. Alguém tem de
dizer isso a elas.
É por
isso que as pesquisas, em geral, são fajutas. Quem se baseia em pesquisas para
agir corre o risco de ser sempre medíocre. Porque a pesquisa aponta para a média
e a média é... bem... medíocre.
Os
grandes cientistas, os grandes inovadores, os grandes artistas, os grandes
inventores, os gênios da humanidade jamais teriam feito algo de novo se
tivessem se guiado por pesquisas. Imagine Dostoievski contratando uma agência
para saber se, em Crime e Castigo, Raskolnikov deve ou não matar a velha usurária.
Nem
mesmo os grandes empresários, que têm de agradar ao público para alcançar o sucesso,
nem esses chegam a lugar algum se seguirem o caminho das pesquisas e da média
da população. Eles têm de seguir o caminho da própria sensibilidade.
Assisti,
outro dia, a uma palestra da Zica, carioca que criou a Beleza Natural, espécie
de método de amaciamento do cabelo crespo, o cabelo duro. Cabelo ruim, como
dizia a minha avó: – David,
tu tem cabelo ruim.
Zica
era empregada doméstica, e hoje sua empresa atende a mais de 100 mil mulheres
no Brasil. Quando foi perguntada sobre o que a levou a inventar aquela
novidade, ela foi singelamente honesta:
– Porque
eu queria que o meu cabelo fosse bonito.
Aí está.
Era a inquietação DELA. A dor que ELA sentia é que a guiou. Ninguém faz nada de
novo se tentar adivinhar o que os outros querem. Fará se souber a dor que lhe
vai na alma.
A
natureza da arte, por exemplo, é revolucionária. A arte, a princípio, choca;
depois se populariza. Quase todas as inovações são assim. As pessoas olham e
torcem o nariz: isso não vai dar certo. Porque a novidade não existe, até acontecer,
e as pessoas não conseguem enxergar o que não existe.
Mas
hoje o mundo é das pesquisas. O mundo é da média. Da massa. Um mundo cada vez
mais democrático, horizontal e medíocre. Viva a mediocridade.
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