sábado, 21 de dezembro de 2013


22 de dezembro de 2013 | N° 17652
VERISSIMO - As aventuras da família Brasil

Passadas as festas

No Brasil, os anos se dividem em dias, semanas, meses, trimestres e semestres, mas também em dois períodos distintos chamados Passadas as festas e Depois do Carnaval. Como o ano brasileiro tradicionalmente só começa depois do Carnaval, isso significa que o período Passadas as festas, quando tudo que ficou em suspenso durante o Natal e o Ano Novo deveria ser retomado, na verdade fica esperando o Carnaval ou o Depois do Carnaval para recomeçar.

Há quem diga que o Passadas as festas é um período tão abrangente que engloba o Carnaval, a Páscoa, etc. e se estende por todo o ano, o que explicaria o fato do Brasil estar sempre adiando o que precisa ser feito. O Passadas as festas de um ano engata no Passadas as festas do ano seguinte e acaba sendo o nome do ano inteiro.

– Será que a reforma política sai este ano?

– Sai. Passadas as festas nos dedicaremos a... Espera um pouquinho. Passadas as festas não vem o Carnaval?

– Vem. E depois vem a Copa do Mundo. – Ai, ai, ai. Acho que ainda não vai ser este ano.

Outra fragmentação do tempo muito popular no Brasil é o minutinho. Estranhamente, o minutinho não é um minuto que passa mais ligeiro do que os outros. Ao contrário: como o seu sinônimo “dois segundinhos”, passa mais lentamente. Em geral “um minutinho” não quer dizer um minuto pequeno. Dependendo da entonação, quer dizer “tenha paciência” ou “não me irrite”. Como em:

– Senhorita, eu estou esperando há meia hora...

– Um minutinho.

– Não posso esperar mais.

– Um minutinho, por favor.

– Quando é que vão me atender?

– Em dois segundinhos.

– Não! Dois segundinhos, não!

Passadas as festas teremos mais tempo, mais disposição, talvez até melhor caráter. As próprias festas vão nos regenerar, seremos outros depois das festas. O Natal trará à tona os nossos melhores sentimentos. Danem-se as evidências, a humanidade tem jeito sim. O homem é bom. A mulher é melhor ainda. O sarrabulho do peru nem se fala. O Papai Noel pode ser falso, mas a emoção é verdadeira. E no Ano Novo? Nos abraçaremos como se só estar vivo já fosse motivo para a comemoração. Ainda não morremos, oba!

E estaremos cheios de planos. Este ano vou largar o cigarro, a bebida, o hábito de limpar os ouvidos com uma tampa de Bic e todos os meu preconceitos. Lerei mais, irei mais ao cinema, carregarei velhinhas para o outro lado da rua mesmo que elas não queiram – tudo isso passadas as festas. O próprio país melhorará, passadas as festas. Faremos todas as reformas necessárias. Acabaremos com a miséria e a corrução. Seremos...


Espera um pouquinho. Acho que isso foi o que eu escrevi no ano passado.

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