segunda-feira, 9 de abril de 2012



09 de abril de 2012 | N° 17034
LUIZ ANTONIO DE ASSIS BRASIL


O fim do mundo

Volta e meia, patéticas e risíveis notícias do fim do mundo assombram a cultura ocidental. Outras culturas, embasadas noutras religiões e noutros valores, falam, sim, num fim do mundo, mas nada imediatamente previsível; situam-no num horizonte milenar – e nesse caso estão certíssimas, pois a ciência prevê o fim do mundo para daqui a alguns bilhões de anos, e irá acontecer de maneira tão gradativa que a espécie humana há muito já não existirá.

Mas a que se deve a recorrência do temor de uma próxima hecatombe universal? Seria bastante simplório creditarmos isso a uma metafísica noção de pecado a exigir corretivo.

Podemos encaminhar esse assunto se pensarmos numa perspectiva que subsume de modo cabal a ideia de punição. Os anúncios do fim de mundo começaram sua série com a civilização, com a sociabilidade e as conquistas da ciência e da filosofia.

Surgiram quando o ser humano começou a pensar criticamente sobre sua existência. De início algo elusivo, epidérmico; depois, um pensamento que, por inorgânico, tornou-se mais assustador: tratava-se da certeza de que tanta civilização infringia algum desígnio superior. Algo metaforicamente representado no mito de Prometeu.

Essa ideia, com seu quê metafísico, foi substituída pela consciência atual, pós-judaico-cristã, de que avançamos demais, possuímos coisas demais, e isso ficará incompreensível e incontrolável. Lembra a ideia da punição, mas num plano meramente ôntico, para usarmos a expressão de Heidegger.

Acumulamos saber demais, ciência demais, e, nos dias de hoje, tecnologia demais; a mesma tecnologia que nos ajuda a viver – e sobreviver – é, também, uma anomalia intelectual que substitui por exclusivo, em algumas cabeças deslumbradas, a reflexão de longo curso.

Nesses parâmetros, o fim do mundo fará com que tudo comece de novo; isso poderá nos obsequiar com a risonha sensação de recuperarmos a candidez perdida, quando não dependíamos dessa humilhante parafernália. Tudo novo, tudo limpo, recomeçaremos inventando a roda.

Ficando pelo raso, não custa lembrar a frase do Grilo, o criado de Jacinto de Tormes, quando perguntado de que doença, afinal, sofria seu patrão. Para Grilo, a resposta era simples: “Sua Excelência sofre de fartura”.

Talvez seja o nosso caso.

Um bom e honesto fim de mundo virá dar jeito nisso tudo.

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