segunda-feira, 9 de abril de 2012



09 de abril de 2012 | N° 17034
L. F. VERISSIMO


Fascinação

Em 1948, o Botafogo jogou em Porto Alegre. O que havia de extraordinário no fato de o Botafogo estar jogando em Porto Alegre? Em primeiro lugar, o próprio Botafogo. Oswaldo, Gerson, Santos (que ainda não era chamado de Nilton para distinguir do Djalma Santos), Geninho, Paraguaio, Otavio...

Em segundo lugar, eu, guri, na arquibancada do estádio do Internacional, com inacreditáveis 64 anos a menos, maravilhado. Em terceiro lugar, um time do Rio estar em Porto Alegre, uma raridade, na época. Havia pouquíssimo intercâmbio de clubes cariocas e paulistas com clubes do resto do Brasil.

Nos campeonatos nacionais de seleções estaduais, a seleção gaúcha invariavelmente eliminava as de Santa Catarina e do Paraná e aí enfrentava a de São Paulo, que invariavelmente nos eliminava. De sorte que vi alguns jogadores famosos de São Paulo em ação.

Do Rio, nenhum. Ademir, Zizinho, Jair etc. – uma geração inteira de estrelas –, eu só conheci pelo rádio, ou nas páginas de jornais e revistas (ah, a emoção ainda viva de comprar o Globo Esportivo todas as semanas, com retratos dos ídolos distantes em rotogravuras coloridas na capa...).

Mas, naquela noite memorável, vi o Nilton Santos em pessoa. Carne, osso e aura.

O Heleno não era mais do Botafogo em 1948. Acho que já tinha ido jogar na Argentina. Talvez ninguém representasse como ele não só o fascínio que os jogadores cariocas que nunca víamos jogar tinham para nós como nossa fascinação pelo próprio Rio, por aquela vida crepitante à beira-mar que também só víamos na imaginação.

Assim, os amores, as brigas, o cabelo engomado e o perfil de cinema do “Gilda” eram parte da sua legenda tanto quanto o seu futebol. E o seu futebol, confirmam todos que o viram jogar, era magnífico.

Até hoje se diz que o melhor ataque já formado numa Seleção Brasileira, pelo menos no tempo em que os ataques eram de cinco, foi: Tesourinha, Zizinho, Heleno, Jair e Ademir.

Heleno era “cerebral”, um adjetivo que caiu em desuso no futebol brasileiro, talvez por falta de cérebros, e ao mesmo tempo um finalizador mortal e grande cabeceador. Tudo isto eu só posso imaginar.

Ainda não vi o filme que o José Henrique Fonseca fez da história do Heleno, mas já gostei. Que faça sucesso e dê frutos: mais filmes sobre futebol – esta paixão nacional tradicionalmente e curiosamente mal aproveitada na literatura e no cinema.

É verdade que personalidades como a do Heleno não são comuns no universo do futebol, mas este tem dramas e comédias sem fim só esperando os roteiristas.

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