Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
segunda-feira, 28 de novembro de 2011
28 de novembro de 2011 | N° 16900
L. F. VERISSIMO
Hitchcockiana
Ele gritou: – Janela Indiscreta!
Ela: – O quê?
– O filme que você está vendo. Posso ver a sua TV daqui.
Os fundos dos dois apartamentos davam para o mesmo poço. Mesmo andar. Da área de serviço de um se via tudo do outro.
Ele: – Adoro o Hitchcock. Ela:
– Eu também.
Já tinham se visto no elevador. Ela morava com uma amiga que nunca aparecia.
– Qual é o seu Hitchcock favorito?
– Estou vendo Janela Indiscreta pela décima vez. Mas acho que meu favorito é Um Corpo que Cai. O seu?
– Os Pássaros.
Ela fez uma cara feia.
Dias depois se encontraram na loja de vídeos.
– Olha o que eu achei – disse ele.
Era Notorius. Aquele em que a Ingrid Bergman e o Cary Grant se encontram na Cinelândia e concordam que o Rio é muito chato. Ela mostrou o filme que tinha alugado. Os Pássaros. Ia rever para ver se desta vez gostava.
– Você não precisa gostar só porque eu gosto.
– É por boa vizinhança – disse ela, rindo.
Naquela noite conversaram, área de serviço a área de serviço. Ele disse que o Notorius tinha envelhecido um pouco. E ela, o que achara de Os Pássaros?
– Sei não... – disse ela.
– Vamos ter que vê-lo juntos.
Foi na noite seguinte. Apartamento dela. A amiga, diplomaticamente, no seu quarto. Os dois na sala. Os Pássaros, argumentou ele, é o filme metafísico do Hitchcock. O único filme de terror na história do cinema sem monstros e sem vilões. O vilão é o mundo, é a natureza reagindo ao homem, uma ordem pré-humana se... Antes de ele terminar a frase, já estavam se beijando. Nem chegaram a colocar o DVD.
Passaram a se encontrar quase todas as noites. Só viam Hitchcock. Às vezes discutiam, “Topázio é um Hitchcock menor!”. “O quê? O quê?!”. Passavam alguns dias sem se ver. Aí ele batia na porta dela com uma raridade (Sabotagem, por exemplo) e faziam as pazes.
Até que um dia a amiga saiu do quarto e ele viu que se tratava de uma loira irresistivelmente hitchcockiana, e se apaixonou, apesar de a loira dizer que seu filme favorito era Ghost. Ele tentou explicar sua traição (“Eu sou coerente! Eu sou coerente!”), mas não adiantou. Foi morto com uma tesourada, como em Disque M para Matar.
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