segunda-feira, 28 de novembro de 2011



28 de novembro de 2011 | N° 16900
KLEDIR RAMIL


Wall Street

Entusiasmado com o movimento Occupy Wall Street que começou em Nova York e se alastra pelo mundo, um amigo meu aproveitou a oportunidade e organizou uma manifestação dentro de sua própria casa.

Ocupou a sala, montou uma barraca e espalhou cartazes reclamando do descontrole das contas domésticas. Principalmente o uso sem limite do cartão de crédito. É que, segundo ele, seu regime de casamento é aquilo que se pode chamar de workshop. Ele work e ela shop.

A mulher entendeu a coisa à sua maneira. Arregaçou as mangas e confeccionou uma faixa reclamando da falta de solidariedade nos fins de semanas, quando não tem empregada: “Ninguém lava os pratos, a cozinha vira um caos”.

O filho pequeno subiu num banquinho e começou a gritar que “é impossível viver com uma mesada dessas”. A guria adolescente deu a entender que as amigas todas já têm iPad e ela não. O pai bufou: “Tá, e aí?”. Foi até o espelho e desabafou: “Tô falando com as paredes”.

A mulher voltou à carga. Lançou uma dissidência do movimento e batizou de Occupy Kitchen, com palavras de ordem afirmando que “a cozinha é o coração da casa”. Entre as reivindicações estava a participação de todos nas tarefas de recolher o lixo, dar comida pro cachorro e pendurar as toalhas. Um exército da faxina.

O guri sentou no tapete e ficou tocando violão. À sua frente, uma latinha velha de ervilha, algumas moedas de 50 centavos e um cartaz onde dizia: “Ajude um pobre mendigo a comprar um PlayStation 3”.

A guria chamou as amigas. Pelo Facebook. E criou uma onda de protestos que se alastrou pelas redes sociais e virou trending topic no Twitter. Algumas indignadas falavam em invadir o bunker do pai ditador e outras enviavam BBM e SMS em solidariedade, apesar de não saberem muito bem do que se tratava aquilo tudo.

O pai pediu a palavra e chamou a atenção para o detalhe de que estavam perdendo o foco. Emendou em um breve discurso lembrando que estavam ali para protestar contra a ganância, “a irmã gêmea da avareza, o primeiro dos sete pecados capitais” e encerrou citando o filósofo inglês Tim Jackson: “Estamos sendo persuadidos a gastar o que não temos, em coisas que não precisamos, para criar impressões que não duram, em pessoas que não nos importam”.

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