domingo, 20 de novembro de 2011


Danuza Leão

Procura-se uma cozinheira

Apesar do tom brincalhão, Nizan publicou um anúncio, em espaço nobre, procurando uma cozinheira

Quando, na última quarta-feira, comecei a ler a coluna de Fernando Rodrigues, aqui na Folha, logo no primeiro parágrafo pensei: "Ah, achamos a mesma coisa; Nizan não podia ter usado o espaço do jornal para um assunto pessoal, isto é, para encontrar uma cozinheira". Mas quando continuei a leitura, vi que não era bem por aí.

Tenho grande admiração por Fernando Rodrigues, acho Nizan um superprofissional, não sou amigona de nenhum dos dois, mas já que Fernando se manifestou sobre a coluna do Nizan, me dou ao direito de me manifestar sobre a coluna de um e de outro.

Apesar do tom brincalhão, Nizan na verdade publicou um anúncio, em espaço nobre, procurando uma cozinheira -e imagino que muitas devem ter aparecido querendo trabalhar em sua casa. Mas é o tal negócio: quem precisa dos serviços de alguém põe um anúncio e paga por ele.

No caso -no meu entender- foi um abuso, pois os jornais vivem de seus espaços publicitários e, claro, Nizan não pagou nada; aliás, deve ter recebido para escrever a coluna. É um problema de não misturar as bolas: opinião é opinião, anúncio é anúncio.

Vamos agora à coluna de Fernando.

Não existe, em português, a tradução exata para "chef de cuisine". Depois que a gastronomia entrou na moda (no Brasil), os restaurantes estrelados têm "chefs de cuisine" famosos, que aparecem na imprensa e viram celebridades. Sempre foi assim em outros países, por aqui é mais recente.

Imagino que uma pessoa rica, que tem uma casa grande e pode arcar com a despesa, gostaria muitíssimo de ter um "chef de cuisine" em casa, mas só se costuma chamar de "chef" quem trabalha em restaurante. Uma cozinheira é considerada como alguém que tem uma profissão "menor", mas ser "chef" -no masculino- pode e é até chique.

Quando Fernando diz que, ao escrever "procura-se uma cozinheira", Nizan mostra "como é resiliente o velho Brasil no nosso cotidiano", e que "até em cabeças como a dele sobrevive um pedaço renitente do Brasil antigo e profundo", nosso grande jornalista, querendo denunciar o preconceito, acabou sendo preconceituoso, logo ele.

Ser cozinheira é uma excelente profissão; uma profissão nobre, pois a culinária de um país é parte importante de sua cultura, e foi descascando legumes que começaram todos os célebres "chefs de cuisine".

Muitos deles são, hoje, donos de restaurantes, os mais talentosos têm filiais em várias capitais do mundo, e lançam produtos com seu nome no rótulo. Uma boa cozinheira vale ouro, e ganha mais do que muitas executivas de grandes empresas. Ter um dom é uma coisa preciosa, seja ele escrever, fazer publicidade ou cozinhar.

E aí chegamos aos politicamente corretos; de uma pessoa que gosta de ficar em casa, que pouco sai, que aprecia seu lar, diz-se que tem índole doméstica. Por outro lado, quem tem um emprego, seja ele qual for, é empregada/o. Então, se uma mulher trabalha dentro de um recinto doméstico, é uma empregada doméstica, não uma "secretária do lar".

Qual a ofensa em ser chamada de empregada? No meu entender, nenhuma. Por que razão "funcionária" ou "secretária" pode, e "empregada" não? Eu me considero uma empregada da Folha; não é ela que me emprega? Ora, ora, são apenas palavras.

Queria eu ter uma casa enorme -e os meios- para ter uma maravilhosa cozinheira, e, se ela fosse baiana, melhor ainda. Já tive uma, Lizete, que importei de Salvador, e lembro com saudades do tempo em que melhor comi na vida.

É o que eu tinha a dizer, apenas uma opinião.

danuza.leao@uol.com.br

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