quinta-feira, 24 de novembro de 2011



24 de novembro de 2011 | N° 16896
LETICIA WIERZCHOWSKI

Da felicidade

Faz alguns dias, tomei um táxi em Buenos Aires em companhia de uma amiga, e o motorista, ao perceber que éramos brasileiras, abriu-se em simpatias. Segundo as suas próprias palavras, aquele motorista “amava o Brasil”. Embora ganhasse a vida como taxista, ele estava terminando um curso de cabelereiro e tinha passagem comprada para o Ceará, onde pretendia recomeçar a vida na beira da praia. “Vocês são a gente mais feliz do mundo”, disse-nos ele, “não têm essa nostalgia platina”.

Expliquei que morávamos no Sul, e que nós, gaúchos, éramos sim um pouco nostálgicos. Mas o homem não se deu por vencido: “Mais do que gaúchos, vocês são brasileiros, e todo o brasileiro é alegre”. Para comprovar a sua certeza, contou-nos que, há alguns anos, tomado por uma depressão que nenhuma pílula nem médico conseguia amenizar, passara alguns meses na Bahia, e curou-se dos seus males em cima de um trio elétrico.

Estava em Buenos Aires temporariamente, liquidando seus haveres, e vinha de muda para o Brasil. Ao final da corrida, para provar a sua simpatia, deu-nos até um desconto.

Lembrei desse simpático encontro por causa de um depoimento que o Paulo Borges, responsável pela São Paulo Fashion Week, deu aqui em Porto Alegre ao participar da recente Semana de Comunicação. Você pode conferir esse papo no Facebook da ARP, buscando o Paulo numa das “planet pills” que a produtora Film Planet produziu. E disse o Paulo Borges que o caminho do Brasil, o seu talento verdadeiro, é a sua capacidade de ser feliz. Somos um povo feliz.

Nossos políticos custam mais caro do que os políticos europeus (e roubam mais), nosso sistema de saúde pública é uma verdadeira piada, nossos cartões postais estão tomados de favelas, e as favelas, tomadas pelo tráfico, nossas leis não funcionam direito, e nossos impostos, altíssimos, não revertem em benefícios para o povo. Mas somos assim alegres, de uma alegria congênita que explode fácil – basta um gol, uma festa de rua, um churrasco com os amigos, um naco de tarde à beira-mar, uma caipirinha gelada.

Tem razão o Paulo quando diz que essa alegria deveria ser um produto, um caminho de pensamento neste momento em que a indústria criativa desponta e ganha força. Palavras do Paulo Borges: “O mundo quer e precisa de uma coisa que só o Brasil pode dar: felicidade”. Aquele motorista portenho, bem, ele já sabia disso...

leticiawierz@bol.com.br

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