19 de agosto de 2016 | N° 18612
NÍLSON SOUZA
A MACARRONADA
Fiquei comovido, outro dia, quando li uma notícia procedente da Itália, originada de uma daquelas cidadezinhas onde o tempo parou entre casas antigas, calçadas de pedras irregulares e um braço de mar com ondas cansadas e sonolentas. Nem guardei o nome do local, ative-me apenas ao fato pitoresco. Os vizinhos ouviram gente chorando alto numa casa fechada e chamaram a polícia. Os carabineiros chegaram rapidamente e bateram na porta com vigor, pensando que teriam de intervir em alguma tragédia. Foram recebidos por um casal de idosos, às lágrimas, que se apressou em explicar a razão da choradeira:
– Solidão!
Os velhinhos sentiam-se sozinhos, sem amigos e esquecidos pelos familiares que moravam longe. Por isso choravam.
Os policiais italianos se sensibilizaram. Entraram, foram para a cozinha, fizeram uma macarronada e compartilharam com os donos da casa o almoço e uma boa conversa. Quando se despediram, o casal sorria.
A vida – como ensinou o poeta Mario Quintana – é um dever que trouxemos para fazer em casa. “Quando se vê já são seis horas... Quando se vê já é sexta-feira... Quando se vê passaram 60 anos!”
E antes que se jogue pelo caminho a casca inútil das horas, como recomendou o saudoso alegretense, a solidão costuma aparecer sorrateira e vai se abancando. Quando se vê, ela já ocupa um lugar na casa. Quando se vê, já assumiu o comando de tudo, inclusive da nossa vontade. Não fala, não ouve e nem ajuda a lavar a louça depois da macarronada. Simplesmente vai ficando e espalhando seu silêncio amargurado por todos os cantos.
Chorar espanta a indigitada? Talvez não, mas sempre atrai compreensão e solidariedade. Já li em algum lugar que o ser humano foge da solidão como quem foge do espelho, porque não aceita ver com clareza o rosto da sua finitude. Porém, como solidão é também um estado de espírito, a fuga tende a tornar-se inconsequente. Melhor é tentar conviver com ela e, se possível, tentar ignorá-la. E, quando ela se tornar insuportável, até chamar a polícia é válido.
De preferência, policiais que saibam cozinhar e que apreciem uma boa macarronada.
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