19 de agosto de 2016 | N° 18612
CLÁUDIA LAITANO
Tempo perdido
Filhos são um investimento de altíssimo risco. Se o seu perfil é de moderado a conservador, talvez não sejam a alternativa mais confiável para retorno afetivo e orgulho vitalícios. Nada garante que aquela pessoinha que você vem patrocinando desde o berço vai devolver sua aplicação de tempo, dinheiro e afeto na mesma moeda – e muito menos de que vai pensar como você.
Ideologia, religião, estilo de vida, relação com dinheiro ou família, estabilidade emocional, tudo isso e quase todo o resto resultam de uma imprevisível combinação entre ambiente e genética. Ame e respeite seu filho, e você terá mais chances de ser amado e respeitado de volta – mas, vamos ser honestos, nem mesmo isso é uma ciência exata.
Quando os pais decidem onde os filhos vão estudar, estão delegando à direção da escola a responsabilidade de avaliar professores, conteúdo e método de ensino, da mesma forma que delegam ao dentista a decisão sobre o melhor aparelho para corrigir a arcada dentária. Para que a minha filha, nascida em uma família de ateus, não precisasse ter aulas de religião, escolhemos para ela uma escola laica. Isso não impediu, obviamente, que ela tivesse professores e colegas católicos, alguns deles bastante enfáticos em suas convicções.
Se o contato com a religião na escola tivesse despertado nela a vontade de fazer a primeira comunhão, pareceria absurdo, a qualquer pessoa de bom senso, que eu culpasse a professora católica por ter expressado sua fé. Já se a professora de biologia tivesse ensinado que Darwin e o criacionismo têm o mesmo valor científico, eu não teria dúvida de que aquela não era uma boa escola. Com a orientação política não é muito diferente. Achou que o professor pisou na bola? Fale com ele, mas se nem isso resolver o problema, procure uma escola na qual você confie. Pais trocam filhos de escola o tempo todo – muitas vezes por motivos bem mais desimportantes.
Num mundo em que informar-se sobre virtualmente qualquer assunto é mais fácil e rápido do que aprender a jogar canastra, imaginar que se pode controlar as ideias e os pontos de vista a que os jovens estão expostos – na escola ou em qualquer outro lugar – não é apenas totalitário, mas anacrônico.
Essa é apenas uma das muitas inconsistências do projeto Escola sem Partido, que de tão despropositado nem merecia estar sendo discutido com tanta seriedade. A lista de problemas para resolver no sistema educacional brasileiro é muito grande para que a gente possa se dar ao luxo de perder tempo com bobagem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário