terça-feira, 9 de agosto de 2016


09 de agosto de 2016 | N° 18603 
DAVID COIMBRA

Prata amarga


O barão de Coubertin dizia que o importante é competir. Claro: ele não competia.

Esses atletas de altíssimo rendimento querem é vencer.

Então, ocorre algo curioso, na hora do pódio: a medalha de bronze dá mais alegria do que a de prata.

Estava no Riocentro, vendo as finais de judô peso ligeiro, até 60kg. Na disputa pela medalha de bronze havia um rapaz do Uzbequistão de nome impronunciável, Diyorbek Urozboev, a quem chamaremos a partir de agora de Uro, porque, se você tentar dizer o nome dele, vai ter torcicolo na língua.

O oponente de Uro chamava-se Amiran Papinashvili, o que é bem mais razoável. Amiran é da Geórgia. Apesar do nome, Uro venceu. Nossa, ficou tão feliz! Ele saltava, erguia os braços, gargalhava. Ao sair do tatame, fez um coraçãozinho com os dedos das mãos e apontou para os torcedores.

Certo. Depois da festa de Uro, veio a final. Enfrentavam-se o russo Beslan Mudranov e o cazaque Yeldos Smetov. Vitória do russo.

Encerrada a luta, o judoca do Cazaquistão permaneceu algum tempo deitado de costas no chão, como se não acreditasse no que havia ocorrido. Enquanto o russo festejava até com algum comedimento, certamente menos do que festejou Uro, Yeldos, o cazaque batido, afastou-se mancando e chorando.

O técnico se aproximou dele e disse algumas palavras lá no idioma do Cazaquistão, decerto a fim de consolá-lo. Não adiantou, Yeldos não segurava o pranto, chegava a arfar de desespero. Manquitolou por alguns metros, ombreado pelo treinador, e desabou no piso do ginásio, aos soluços. O técnico se acocorou ao seu lado, içou-o pelos ombros, pôs o braço em volta de suas costas largas e o amparou até o vestiário.

Quando os dois passaram em frente à arquibancada, o público, emocionado com a cena, aplaudiu.

Yeldos havia conquistado a medalha de prata, e era a derrota vestida de quimono. Uro havia conquistado a medalha de bronze, e quase escalava as paredes do ginásio, de tanta alegria.

É aquilo: não importa o que a vida faz com você, importa é o que você faz com o que a vida faz com você.

QUE FEIO, FERNANDO MEIRELLES

Ontem, eu e o Potter entrevistamos o diretor de cinema Fernando Meirelles no Timeline. Foi uma conversa alegre, amena. O Potter abriu a entrevista agradecendo a Fernando pelo trabalho feito na linda cerimônia de abertura da Olimpíada. Em dado momento, Fernando estava falando da precisão que se deve ter em todas as cenas, num trabalho dessa dimensão, e perguntei sobre a participação de Gisele Bündchen. O diálogo se deu EXATAMENTE como reproduzirei abaixo.

Comecei perguntando:

– Por exemplo: a cena da Gisele Bündchen. Ela caminha 128 metros...

Nisso, ele me interrompeu e disse:

– Ela errou, por exemplo!

Fiquei surpreso:

– Ela errou?

E ele:

– Tiveram dois erros. Esse foi um. Eu:

– No que ela errou? Ele:

– A gente já tinha combinado uma velocidade, que é a velocidade que ela anda no desfile. Eu acho que ela tava empolgada, ela andou um pouquinho mais lento.

Fernando seguiu explicando que haveria uma ceninha com o Tom Jobim, e o Potter brincou que o erro havia sido bom, “porque assim tivemos mais tempo de Gisele Bündchen”.

Corta, como diria o próprio Fernando Meirelles.

Poucas horas depois, certamente assustado com a repercussão da entrevista, Fernando Meirelles publicou o seguinte em sua conta no Twitter:

“Um dia aprendo a lidar com jornalistas. Gisele arrebentou na cerimônia de abertura. Tem neguinho aí dizendo que achei que ela errou. Errou nada. Quem errou fui eu ao cair na arapuca!”

Ora, ora... Não tem nenhum “neguinho”, foi ELE, Fernando Meirelles, quem disse que Gisele errou. Ninguém havia perguntado, até porque todos, eu e o Potter inclusive, achamos imperial a participação de Gisele. Não foi uma “arapuca” e Fernando Meirelles não tem que “aprender a lidar com jornalistas”, tem apenas que assumir o que diz. Até porque ele não disse com maldade, não foi uma crítica, ele não se queixou de Gisele Bündchen. Foi apenas um comentário sobre os bastidores da cerimônia. Que, repito, foi tão bela quanto grandiosa. A Fernando Meirelles, que tem talento de sobra, faltou um pouco de coragem.

COMO A VOLUNTÁRIA VIU O PRÍNCIPE

Vi, nas proximidades do Velódromo, uma movimentação grande de policiais com moto e soldados do Exército e da Força Nacional e carros pretos e me aproximei de uma voluntária para descobrir do que se tratava. Ela era uma mulher de uns 45 anos, de aparência tranquila, que observava tudo com interesse. Perguntei para que tanto aparato. Ela:

– É o príncipe de Mônaco que está aí.

– O príncipe Albert?

– Ele mesmo.

Olhei para ela. Ela ainda fitava a janela traseira do carro preto que levava sua alteza.

– E que tal o príncipe? – perguntei.

Ela franziu a testa:

– Ah, é aquilo, né: branco... careca...

No Rio, para impressionar, há que se ter mais do que cetro e coroa.

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