quinta-feira, 18 de agosto de 2016


18 de agosto de 2016 | N° 18611
DAVID COIMBRA | David Coimbra

Tudo culpa do futebol gaúcho

A decadência do futebol brasileiro se deve a dois fatores:

1) A Lei Pelé.

2) O futebol gaúcho.

A culpa é dos dois, a razão é uma só: eles prejudicam a formação do craque tipicamente brasileiro, e o tipicamente brasileiro é Garrincha, é Zico, é Ronaldinho, é o café com leite e o pão com manteiga, é pastel com guaraná.

A Lei Pelé acabou com o craque tipicamente brasileiro porque deu carta de corso aos piratas europeus. Como Francis Drake, que saqueava em nome da Rainha Virgem, eles atravessam o Mar Tenebroso e vêm se cevar diretamente das estufas dos clubes indefesos. Os malditos bucaneiros arrancam do chão os prováveis craques ainda em botão e os levam para o lado de cima do Equador, onde eles irão se abastardar: não serão mais brasileiros, não serão nunca europeus, não serão os craques que poderiam ter sido.

Já o futebol gaúcho, ao tornar-se vencedor, perverteu o futebol brasileiro. Um, dois, três volantes furiosos, que vigiam a meia-lua como Cérbero vigia o portão do mundo inferior com suas três cabeças, homens grandes na grande área, pontas que fecham e, assim, deixam de ser pontas, meias que correm o campo inteiro, marcação, marcação, marcação. Esse é o futebol gaúcho. Muito saudável – para o futebol gaúcho. Quando Rio e São Paulo, ou seja, o Brasil resolveu imitar essa fórmula vencedora, se desfigurou, e virou perdedor.

Agora, essa jovem seleção olímpica, de certa forma bafeja o Brasil com uma novidade antiga: eles jogam como jogávamos. Volante, volante mesmo, tem um só: o gremista Walace. Renato Augusto volanteia, mas é meia. E, à frente deles, jogadores apropriadamente de frente: Luan, Neymar, os Gabriéis, todos atacantes, todos habilidosos, todos agressivos, os Herculoides.

Os amantes do futebol casmurro casmurros ficarão. “Time alegrinho”, ouço-os desdenhar. Mas ensinar um bom jogador a marcar é fácil, já ensinar um marcador a ser bom jogador é impossível. Isso dizia Valdir Espinosa, e o provou, em 1983, quando foi campeão do mundo com Caju, Mario Sérgio e Renato, tipicamente brasileiros, mas ajudando na marcação, como Neymar ajudou ontem.

A seleção olímpica está jogando como a verdadeira Seleção Brasileira. E enfrentará a seleção alemã, que também joga como a verdadeira Seleção Brasileira. É hora do original passar por cima do imitador.

PASTEL, AFINAL

Comi pastel.

Conto isso porque nos Estados Unidos não tem pastel. Um país daquele tamanho, com tamanha variedade, e melancolicamente sem pastel.

Confesso que havia me esquecido desse pormenor. Estou há dois meses no Brasil e ainda não tinha comido pastel. Nem pensar no pastel pensava, distraído que estou com o nado sincronizado, com o badminton, com a luta greco-romana.

Então, fui ao Zé Colmeia, que é um bar que tem aqui perto, e lá vi uma grande bandeja de pastéis quentinhos, recém-saídos do forno. Deu-me uma emoção. Uma brasilidade ardente me correu nas veias. Percebi que existia o risco de sair do Brasil sem ter comido um único pastel. Jamais me perdoaria por essa falha. Depressa, peguei três de camarão, acomodei-os num pratinho e me instalei atrás de uma mesa para saboreá-los. Com guaraná, é claro.

Fui, naquele momento, como a seleção olímpica, tipicamente brasileiro.

CUIDADO!

Sei que cometo uma temeridade. O futebol é um jogo que vive desmentindo afirmações peremptórias. Além disso, a seleção de Honduras achicou-se diante do Brasil. Incrustou três zagueiros na frente da área e de lá eles não saíram. Resultado: criou-se uma faixa livre de 10 metros de campo, por onde se imiscuíam os atacantes do Brasil. Foi fácil demais.

FORA DILMA, FORA TEMER

Outro dia, durante uma luta de boxe menos interessante para a torcida brasileira, algum gaiato gritou de um ponto da arquibancada do ginásio:

– Fora Teeemeeeer!

Do lado oposto, uma voz também masculina respondeu:

– Fora Diiiiilmaaaaa!

Ao que o primeiro rebateu:

– Fora Teeemeeeer!

E veio a resposta:

– Fora Diiiiilmaaaaa!

E assim ficaram: fora Temer, fora Dilma, fora Temer, fora Dilma, aquilo ecoando pelas paredes do ginásio, até que um terceiro mandou:

– Cala a boooocaaaaa!

E se calaram ambos. Quizílias políticas não têm sido cevadas nesta Olimpíada.

A TORCIDA MALAIA

Quem reclama que a torcida brasileira é ruidosa demais não viu ainda o desempenho da torcida da Malásia no badminton. Assisti a um empolgante jogo de uma dupla de malaias contra uma dupla de inglesas, as malaias morenas e algo retacas, as inglesas branquicelas e longilíneas.

Havia um grupo de malaios na arquibancada. Eu os contei: eram 22. Faziam barulho como se fossem 2 mil. As inglesas, acostumadas à discrição britânica, deixaram-se perturbar. As malaias venceram até com certa facilidade. A torcida tem feito a diferença nesta Olimpíada.

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