03 de novembro de 2014 | N° 17972
ARTIGO ZH
É
VOTANDO QUE SE APRENDE A VOTAR
Encerrado o processo eleitoral, aliás marcado por condutas
incompatíveis com o convívio humano e muito menos com a disputa democrática,
viu-se que a candidata à reeleição, que dissera que na eleição “faria o diabo”,
cumpriu sua promessa, e que seu partido fez coisas de encabular o demônio.
Limito-me a salientar uma questão que encerra outras, assim
significativas como preocupantes. A principal revista de circulação nacional
publicou, na edição que circulou às vésperas da eleição, matéria de capa em que
um réu, em processo de delação premiada, disse que o ex-presidente e a atual
tinham conhecimento das entranhas do malfadado “petrolão”.
Em reação, a candidata e seu principal cabo eleitoral
falaram em golpe, o que ninguém levou a sério; articularam inédita censura à
Justiça Eleitoral; sem falar em depredações e ataques ao prédio da editora, há
tanto tempo não vistos entre nós que poderíamos denominar de vetustos
empastelamentos.
Por mais crédulo que alguém seja, poderia conceber que o
presidente Luís Inácio ignorasse a existência do mensalão e de suas funções,
assim como do esquema de financiamento partidário que veio a sucedê-lo? Seria
plausível julgar que o presidente da Petrobras e os ministros de Estado com ela
envolvidos ignorassem as linhas de produção e os valores de negócios da maior
empresa nacional?
Essa obviedade, que o jornalista Nelson Rodrigues chamaria
de ululante, foi a bombástica revelação da revista e provocou reação não vista
no país em mais de meio século. Os grupos de arruaceiros, alguns subsidiados
com verbas oficiais, que já proliferam na Venezuela e têm inspiração nas SA do
nazismo, são ameaça concreta e perigosa à democracia.
O fato faz lembrar a reação do tirano que, sabendo que
estava a caminho mensagem com notícia que lhe era adversa, determinou a seus
sequazes que eliminassem o mensageiro.
Contudo, por maiores que tenham sido os deslizes e as
máculas do prélio eleitoral, não hesito em reconhecer e proclamar que também
foram úteis e promissores os efeitos positivos dessa experiência. De mais a
mais, é votando que se aprende a votar.
Jurista, ministro aposentado do STF
PAULO BROSSARD
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