terça-feira, 18 de novembro de 2014


18 de novembro de 2014 | N° 17987
MOISÉS MENDES

Os parentes

Uma das grandes dúvidas da humanidade é se existem mais Becker do que Müller no mundo. O fotógrafo ijuiense Carlos Becker tenta medir o tamanho das duas famílias no Brasil pelos nomes dos negócios de beira de estrada.

Pegue a estrada e você vai passar pelo Posto Müller, o Restaurante Becker, a Mecânica Müller & Filhos, a Estofaria Irmãos Becker. Os Becker e os Müller, diz meu amigo Carlos, pertencem às famílias com a mais forte autoestima do Brasil, ou são os nossos maiores empreendedores. Seus nomes estão em tudo o que eles fazem.

Pois as placas da Mendes Júnior, ao longo da BR-290, iludiram minha infância com a ideia de que eu pudesse ser parente dos donos da empreiteira. Acompanhei a construção da estrada.

Até que um dia desisti de me iludir. Os Mendes da Mendes Júnior eram de Minas e dificilmente seriam meus parentes. Quando anunciaram a prisão de donos de empreiteiras envolvidas na roubalheira da Petrobras, me lembrei da minha fantasia de ser parente de um bilionário.

Não gostaria de ver o vice-presidente da Mendes Júnior, Sérgio Mendes, aparecer algemado com uma camisa de time de futebol, como nessas fotos de criminosos comuns.

Cheguei a pensar que o moço, por ser mineiro, poderia surgir na capa dos jornais com uma camiseta do América. Mas não. Um Mendes é um Mendes, mesmo em seus piores momentos. O herdeiro do grupo avisou que se apresentaria à PF em Curitiba. Mas que iria de jatinho. E foi.

Tento fazer humor com isso tudo porque já levei a sério demais as tentativas de policiais, promotores e juízes de enquadrar corruptores dos altos escalões das empreiteiras.

Peçam ao promotor Sílvio Marques, de São Paulo, as listas de executivos de empreiteiras que já contaram a ele como corrompem. Peçam a esse caçador de corruptores os nomes dos punidos e se penalizem com seu constrangimento.

Dois delatores do caso Petrobras, executivos da Toyo Setal, contaram agora que desde os anos 1990 as empreiteiras pagam propinas. Pergunte aos investigadores quantos corruptores eles conseguiram prender no caso Collor, no escândalo dos Anões do Orçamento, no superfaturamento dos precatórios do DNER, na fraude da licitação do Sivam, na Amazônia. Quantos estão presos pela Operação Satiagraha, em que os punidos foram (acredite) os delegados da Polícia Federal?

Quantos serão presos pelo cartel da propina do metrô de São Paulo? Quantos, dos 23 detidos pela PF desde sexta-feira, você verá entrando na cadeia, não como investigados, mas como condenados?

Corruptores têm a favor deles o fato de que não estão todo dia nos jornais e na TV, como os políticos corruptos. O corruptor sem rosto é a parte sem glamour de um escândalo.

Entrei no Google para saber mais do homem que, pela minha ilusão de infância, poderia vir a ser meu parente e que se apresentou de colarinho e jatinho à Polícia. Imagino que seja neto do fundador, José Mendes Júnior, que criou a empresa em 1953, o ano em que nasci.

Também entrei no site da empresa e xeretei a missão da corporação neste vasto mundo. É bem específica, quadrada, óbvia como um bloco de concreto: “Propiciar soluções de excelência em negócios de engenharia”.

E estes são, pela ordem, os seus valores: excelência (aparece de novo), respeito ao ser humano, cumprimento de contratos, perseverança e ética.


Não vou dizer mais nada. E se esses caras forem mesmo meus parentes?

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