09
de novembro de 2014 | N° 17978
FABRÍCIO
CARPINEJAR
Não se pode mais idealizar nesta
vida?
A
mulher sempre é culpada pela idealização. Por esperar demais de um amor.
Porque
o amor que ganha não se equipara ao amor que deseja.
Porque
há um completo desencontro entre o que ela sonha e o que ela suporta ao
acordar, entre o anseio pela cumplicidade e a avareza que aguenta num
relacionamento.
E
ela se torna culpada: é ela que não valoriza o que tem, não se reduz ao que vê,
não agradece o que recebe.
E
ela se torna uma esnobe ao abandonar relações justamente por defender sua
felicidade. E parece que esta felicidade não existe e está sendo burra em
persegui-la.
Será
que deveria se conformar com o pior e desperdiçar sua existência com o pior?
Não se pode mais idealizar? É um crime conservar o apelo romântico de achar um
príncipe, sua cara-metade, seu complemento da alma? Será que ela necessita
fingir que a bijuteria brilha como uma joia? Fingir que o coaxo é um canto de
cisne? O pessimismo é a expressão da saúde emocional hoje em dia?
A
idealizadora sofre, apanha, é xingada, apedrejada, excluída socialmente, é a
Geni da canção de Chico Buarque, é a nova Madalena da Bíblia.
Não
é ela que está certa, ela que é excessivamente exigente.
Não
é ela que sabe o que quer, ela que é perfeccionista.
Não
é ela que tem razão, ela que vive cobrando, arrumando briga e procurando
defeito.
Não
é ela que procura a qualidade, ela despreza as opções.
Seu
sofrimento é visto como um despropósito. Acaba ganhando o descrédito dos amigos
e da família, o estigma de que é fora da realidade, de que não valoriza o
pouco.
Já
ninguém acredita quando ela diz que vai casar.
- De
novo?
Já
todos reclamam quando ela anuncia que cansou de casar.
-
Não pode desistir.
Se
ela insiste, é louca. Se ela desiste, é louca.
Nunca
agrada e corresponde às expectativas dos seus próximos. Mas não pode ter suas
frustrações, é proibida de ter suas decepções, é vetada de ter suas desilusões.
Precisa
suportar as lamúrias dos outros, mas não pode expressar sua insatisfação.
A
idealização é vista como uma alucinação, um distúrbio psicológico: você está
querendo alguém que não existe, forçando a projeção, não enxergando o que sua
companhia guarda de bom e verdadeiro.
Não
pode reclamar de barriga vazia pois está consolidada a ideia de que reclama de
barriga cheia. Como se namorar ou casar fosse uma benção, quando é apenas mais
uma formalidade do machismo.
Sem
idealização, não existe ambição no amor, esperança no amor, fé no amor.
Nivelar
por baixo é desastre. Quem se contenta com o banhado jamais cultivará um
jardim.
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