29
de novembro de 2014 | N° 17998
NÍLSON SOUZA
DESAGRAVO
De
vez em quando, me ponho a pensar em como reagiriam personagens ilustres que já
partiram se voltassem e vissem o que ocorre nos logradouros públicos que
receberam seus nomes. Em Porto Alegre, certamente haveria muita perplexidade.
Imagino,
por exemplo, o general Lima e Silva dando uma banda pela Cidade Baixa e
passando pelo local onde morava na antiga Rua da Olaria, que agora leva o seu
nome. Ou o padre Chagas conhecendo a madrugada fervente da rua que o homenageia
no Moinhos de Vento.
Mas
o personagem que mais me comove neste confronto imaginário entre a memória e a
realidade é Mario Quintana. Na zona norte da Capital, batizaram um bairro com o
nome do poeta – e não passa semana sem que a brandura do alegretense que
suspirava fumaça e almoçava quindins seja associada, no noticiário policial,
aos crimes lá cometidos. Nesta semana mesmo, ao ler sobre o assassinato de um
jovem naqueles tristes quintanares, surtei um plágio:
Olho
o mapa da cidade
Há
um bairro com meu nome
Nele,
um corpo estendido
(É
nem que fosse o meu corpo)
Sinto
uma dor infinita
Das
ruas de chão batido
Onde
a miséria habita
Há
tanta esquina maldita
Tanta
vingança nas paredes
Há
tanta moça bonita
Nas
ruas que não andei
(E
há uma rua assombrada)
Que
nem em pesadelos verei...)
Quando
eu voltar, um dia desses,
Poeira
ou sombra animada
No
escuro da madrugada,
Serei
um pouco fantasma
Invisível,
silencioso
Que
fará tudo mudar
Com
a força do olhar
E um
apelo clamoroso
Se
querem me homenagear
(Neste
precário lugar)
Melhorem
a vida do povo
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