sábado, 22 de novembro de 2014


23 de novembro de 2014 | N° 17992
L. F. VERISSIMO

As peladas de Porto Alegre

Em 1986, passamos quase um ano em Roma. A família toda. Minha mulher ficou conhecida na região em que morávamos – Monteverde Nuovo – porque era da cidade do Falcão, que pouco tempo antes tinha levado o Roma a ganhar o campeonato italiano, um título que perseguia havia anos. Só por vir de Porto Alegre, de onde também viera “il divino Paulo Roberto”, a Lucia tinha atenção especial no açougue, na feira e no resto do comércio do bairro. Porto Alegre era conhecida em todo o mundo – bem, pelo menos o mundo do futebol – graças ao Falcão. A quem devemos (e ele nem sabe) boa parte do prazer da nossa temporada romana.

A cidade voltou a ser reconhecida internacionalmente pelo Fórum Social Mundial. Era raro você mencionar, na Europa, que era de Porto Alegre sem que o Fórum fosse lembrado, e identificado como o que foi nas suas várias edições na cidade, um congresso dos excluídos, o oposto do Fórum dos cachorros grandes de Davos. E o reconhecimento não era só de quem lia jornal. Era do jornaleiro também.

E, agora, depois do Falcão e do Fórum Social, voltamos ao noticiário mundial com as peladas. Até o momento, se não perdi a conta, quatro mulheres nuas e um travesti também nu passaram correndo por fotógrafos que, a julgar pelas fotos tiradas, não foram rápidos o bastante: só se veem as peladas de costas, depois que passaram. Ainda não se viu uma de frente.

Talvez todas sejam uma só, pela bunda em trânsito fica difícil dizer. Especulações sobre a origem e os objetivos das peladas se espalham pelo mundo. Haveria alguma mensagem subliminar na sua galopante nudez? Seria um protesto contra o preço da roupa? Uma manifestação de liberdade contra convenções repressivas e a moral burguesa?

Ou apenas uma celebração da primavera, e um prenúncio do que nos espera com o aquecimento global? É provável que o número de peladas se multiplique com a chegada do verão. O que só aumentará o mistério – quem são elas, de onde vêm, o que querem, por que só são vistas de costas, onde carregam o dinheiro pra comprar um picolé? – e, claro, a atenção do mundo. Além do nosso orgulho municipal.

SAUDADE

Da série “Poesia numa hora destas?!”:

Ai que saudade...

do tijolinho de banana

do meu Autorama

do Cinerama

do Mario Quintana


e da Petrobras pré-lama.

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