EDUARDO
GIANNETTI
Estatais aos
pedaços
O
paradoxo salta aos olhos. Temos um governo de perfil estatizante, cioso da sua
orientação nacional-desenvolvimentista, mas que logrou a proeza de arrebentar nossas
duas principais empresas estatais. Obra de raro descortino.
A
Petrobras, orgulho nacional, não só perdeu a condição de apresentar um balanço
auditado crível como será forçada a republicar balanços anteriores, corrigindo
as baixas referentes ao pagamento de bilhões de reais --quem saberá ao certo?--
em propinas nos últimos anos (outro exemplo da máxima, atribuída a Pedro Malan,
de que "no Brasil até o passado é imprevisível").
Já a
Eletrobras, vítima da MP 579, de 2012, que antecipou a renovação das concessões
de energia mediante a redução das tarifas, acaba de admitir que não disporá de
recursos para pagar dividendos neste ano.
Além
da queda do seu valor de mercado, com ações negociadas abaixo do valor
patrimonial, a Eletrobras teve prejuízo de R$ 2,7 bilhões só no terceiro
trimestre deste ano, o que inviabiliza a remuneração mínima de 6% prometida aos
acionistas.
Os
caminhos do inferno, é claro, diferem. A ruína da Eletrobras foi fruto das boas
intenções do governo Dilma (o setor elétrico, aliás, teria sido o tema da
dissertação de mestrado da presidente na Unicamp), ao passo que a devastação da
Petrobras resulta, entre outras coisas, da ação articulada de profissionais:
uma quadrilha de empreiteiros, burocratas, lobistas e dezenas de políticos que
conferiu ao lema getulista --"o petróleo é nosso"-- inédito e
inadvertido significado.
Mas
existe um substrato comum a esses descalabros. Ambos refletem a deformação
patrimonialista do Estado brasileiro --"o capitalismo politicamente
orientado", no dizer de Raymundo Faoro em "Os Donos do Poder",
que aportou por aqui com as caravelas, atravessou cinco séculos de história e
foi alçado a novo patamar no atual governo.
As
facetas do patrimonialismo relevantes nestes casos são 1) o microgerenciamento
e a tutela do Estado sobre a atividade econômica, alterando regras e revendo
contratos de forma arbitrária ao sabor de conveniências circunstanciais e 2) o
condomínio do poder calcado na simbiose promíscua entre público e privado
aliado ao loteamento de órgãos e empresas estatais como forma de cooptação
política.
A
probabilidade de existir corrupção aumenta à medida que os governos se envolvem
em todos os meandros da economia. A debacle da Eletrobras e o escândalo da
Petrobras chocam pela magnitude, mas estão em perfeita linha de continuidade
com a atual recaída patrimonialista.
O
Brasil carece de instituições que mantenham os cidadãos e a economia a salvo
dos abusos, inépcia, venalidade e ambições dos donos do poder.
EDUARDO
GIANNETTI escreve às sextas-feiras nesta coluna
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