09
de novembro de 2014 | N° 17978
LUÍS
AUGUSTO FISCHER
Sucessão
A
derrota da candidatura de Tarso Genro ao governo do Estado (e a de Olívio Dutra
ao Senado) me deixou com um desconforto que ainda agora estou tentando entender.
Não se trata apenas da derrota dos candidatos da minha predileção, nem da vitória
do Sartori, a quem, falando nisso, desejo um excelente governo, esperando que
se cerque de gente boa e faça o que cabe fazer. Para a Cultura, não são poucos
nem são fracos os potenciais secretários. Na minha área, estão aí José Fogaça e
Sergius Gonzaga, duas figuras de primeiro nível.
E,
bem, não estou aqui para dar palpites, nem o futuro governo precisa deles, bem
sei. Quero é tentar encontrar o fio da meada do meu desconforto. Onde ele começa?
Acho
que é uma certa sensação de orfandade o meu ponto. O primeiro enunciado me
surgiu assim: bá, os meus candidatos, agora derrotados, andam na volta dos 70
anos. É certo que hoje em dia ter 70 anos não impede nada em matéria de vida
produtiva, até na política, essa arena tão particular e agora tão rebaixada da
vida. Mas mesmo assim aos 70 anos a curva da vida é outra que aos 50, nem falar
dela aos 40 ou 30. (E aproveito para desejar vida longuíssima e fértil aos
setentões em causa.)
Tarso,
Olívio, Raul Pont, Flávio Koutzii, para ficar nos mais notórios líderes
petistas do Estado, vêm de pendurar as metafóricas chuteiras eleitorais. O Flávio
já tinha largado quatro anos atrás, agora foi o Raul, e os dois se somam aos
derrotados de agora. Minha pergunta é: o que se aposenta com eles?
Não
sei responder. Certo que há setentões e mesmo oitentões na ativa, no PT e em
outros partidos palatáveis para um eleitor e cidadão como eu, capazes de vir a
fazer coisas boas e importantes na gestão pública; mas algo se perdeu nas
derrotas e aposentadorias aqui evocadas. E me dou conta de que estou fazendo é um
balanço da minha geração.
Nós,
que andamos entre os 50 e os 60, mais ou menos, quem somos, na arena da política?
Sem citar nomes, porque não se trata disso (meus deputados são da minha geração
e são gente de valor), penso que não obtivemos mais a síntese que os
aposentandos eram e simbolizaram – de algum modo, eles reuniam em si as
características de serem ao mesmo tempo gente de ação e de formulação, de eleição
e palanque, como de pensamento e crítica teórica. Uns mais, outros menos, essas
figuras foram e são a maturidade, talvez o zênite, de um específico jeito de
ser de esquerda depois da II Guerra Mundial – e aqui é inevitável ajuntar o
adjetivo “sartreano” a esse jeito.
Com
o Olívio, o Tarso, o Raul e o Koutzii deu sempre para falar de um grande
romance, um filme marcante, um poema, tanto quanto para formular uma leitura da
conjuntura política de varejo e para discutir os fundamentos e estruturas do
poder. (Evito perguntar ao meu eventual leitor de quantos mais se poderá dizer
o mesmo.)
Sei,
ainda dá para falar com eles, que estão aí, com saúde e inteligência, e sei que
gente como eu vai continuar a contar com eles. Repito que desejo tê-los perto
por décadas ainda, mas não consigo deixar de me sentir um tanto órfão com as
aposentadorias e derrotas recentes.
Diria
um latino, já de si uma figura de outra época: “Tempus fugit”. Bem isso.
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