Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
22 de setembro de 2010 | N° 16466
DAVID COIMBRA
A Grande Festa
Posso muito bem ficar rico qualquer hora dessas. Tanta gente fica, por tantas razões. Se ficasse, você sabe o que faria.
Faria A Grande Festa.
Reuniria todas as pessoas de quem gosto, eu disse TODAS, inclusive as que a vida apartou de mim, inclusive as que moram longe, inclusive as que não gostam mais de mim, que continuo a gostar delas, pois reuniria todas, eu disse TODAS, n’A Grande Festa.
A ideia de A Grande Festa seria afirmar a essas pessoas o quanto gosto delas. Diria isso de um jeito prático: realizando-lhes os desejos. Mas tão-somente desejos que pudessem ser pagos com o dinheiro da minha nova fortuna e que fossem consumidos por inteiro durante A Grande Festa. Assim:
O Ivan Pinheiro Machado anseia em ver o flamingo cor de rosa que a Megan Fox tatuou numa parte recôndita do corpo? Contratarei Meguinha para um strip particular, ela tirando a roupa com torturante parcimônia, peça por peça, ao som do tema da Pantera Cor-de-Rosa.
A Deca Soares quer se empanzinar com um banquete do chef Ferran Adrià? Cá estão meus Euros. Tragam-me o catalão e sua equipe, bem como as iguarias que ele possa imaginar, e que as prepare diante da Deca, dando-lhe de provar da própria colher com que mexe e remexe o molho denso.
O Cagê Lisboa sonha em assistir aos Stones beeem de perto? Introduzirei Mick et caterva DENTRO de seu quarto, e ele os verá a metro e meio de distância, deitado na cama, mãos cruzadas atrás da nuca, de pijama de guarda-chuvinha, o dedão do pé nu marcando o ritmo de It’s only rock’n roll, but I like it.
Faria tudo para mostrar às pessoas de quem gosto como gosto delas.
Se você é uma delas, se você teve passagem emocional pela minha vida, torça para que eu enriqueça.
No caso improvável de que tal não ocorra, preciso achar outra forma de homenagear as pessoas do meu afeto. Há premência de fazer isso, porque algumas já se foram. Essas fico a lamentar que lhes tenha reservado pouca atenção.
Há quem me acosse a memória em datas especiais, infalivelmente. O velho Salim Nigri, por exemplo, não há como não lembrar dele num 22 de setembro.
Durante anos, a cada 19 ou 20 de setembro, o Salim me ligava para falar do 22 que se avizinhava. Referia-se ao célebre Gre-Nal Farroupilha.
– Vai publicar alguma coisa a respeito? – perguntava com sua voz grave e tenra.
Eu contava que já tinha publicado em anos anteriores, que para apurar aquela história havia bebido direto na fonte: ouvira-a do herói do clássico, Oswaldo Rolla, o Foguinho. Foi em seu apartamento na Senhor dos Passos que Foguinho me contou como foi emblemático aquele título em comemoração ao centenário da Revolução Farroupilha.
No Gre-Nal anterior, o ponta-esquerda do Grêmio, Castilho, havia marcado um gol histórico e talvez único no futebol mundial. O Inter vencia por 1 a 0 quando um aviãozinho sobrevoou os Eucaliptos. Objetos voadores, identificados ou não, eram novidade absoluta naquele 1935. A defesa colorada parou, olhando para cima, boquiaberta, e gritando como o anão Tatu, da Ilha da Fantasia:
– O avião! O avião!
Do que se valeu o matreiro Castilho: chutou. O goleiro Penha, fascinado com o invento de Santos Dumont, nem viu a bola entrando. Gol do Grêmio.
Depois da façanha aeroesportiva, Castilho... sumiu. Ninguém sabe, ninguém viu, o atacante só foi reaparecer no ano seguinte, contratado pelo Inter. Um dos primeiros casos de sequestro de jogador do Rio Grande do Sul.
No Gre-Nal subsequente ao do “Gol do Avião”, o Grêmio, portanto, estava desfalcado de Castilho. Pior: o empate dava o título ao Inter.
Era 22 de setembro.
Tudo ia mal para o Grêmio. O Inter jogava melhor e atacava com urgência. Só não marcou porque o Grêmio tinha uma lenda debaixo do travessão de madeira: Eurico Lara. Mas, no intervalo, Lara sentiu-se mal. Teve de ser levado para a Beneficência Portuguesa de onde sairia da vida para entrar na história.
Sem seu goleiro mítico, o Grêmio não encontrava forças para suplantar o eterno rival. A torcida do Inter, em maioria nos pavilhões da Baixada, já festejava o título. Até que, aos 42 do segundo tempo, o juiz apitou falta na intermediária. Foguinho colheu a bola da grama e disse para Mascarenhas:
– Levanta na área. O Risada vai tirar de cabeça e eu vou pegar o rebote.
Foi como se estivesse no script. Mascarenhas ergueu à altura do pênalti, Risada cabeceou, a bola voou para a meia-lua e lá estava Foguinho com sua canhota de bazuca, CATUMBLA!!!, 1 a 0. Na saída de bola, Foguinho retomou-a ainda no grande círculo e foi driblando todo um Inter perplexo e foi avançando e foi e foi e, já dentro da área, escorou para Laci fazer o 2 a 0 definitivo. Uma vitória tão retumbante que os gremistas decidiram festejá-la por cem anos com um jantar em 22 de setembro, o “Jantar Farroupilha”.
Nesse primeiro 22 de setembro sem Salim Nigri, tinha de lhe prestar essa homenagem. Tinha de dizer, de alguma forma, como sinto saudades dele. As outras tantas pessoas de quem gosto vão ter que aguardar por outras colunas. Ou, talvez, até que eu fique rico.
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