quinta-feira, 16 de setembro de 2010



16 de setembro de 2010 | N° 16460
LETICIA WIERZCHOWSKI


Bergamota não

A vida cotidiana de um casal também é feita de pequenas incompreensões. Gostos, hábitos, minúsculas manias ordinárias que desentendemos, e que viram motivo de piada numa relação a dois.

O meu marido, por exemplo, tem certas esquisitices absolutamente benignas que me intrigam. Como é que uma pessoa pode não reconhecer o próprio travesseiro? Tem gente que paga o mico de entrar num avião para São Paulo levando o travesseiro debaixo do braço. Bem, essa pessoa não é o meu marido.

Toda noite, quando vou para a cama depois dele, lá está o homem dormindo com o meu travesseiro! E não é por amor, mas por absoluta falta de reconhecimento… Outra mania curiosa do meu cônjuge é comer bergamota e não colocar as cascas no lixo.

Ele bota tudo no lixo, menos cascas de bergamota: deixa-as sobre a pia como uma espécie de troféu da vitamina C ingerida durante a minha ausência. Questionado sobre o assunto, meu caríssimo respondeu que adora o perfume da fruta em questão e por isso deixa suas cascas pela casa.

Trancar porta também não faz parte dos hábitos da minha cara-metade. Nem porta de casa, nem porta de carro. Lugar de chave, para ele, é na fechadura – às vezes, do lado de fora, mesmo. Vidro aberto é absolutamente indispensável também, mesmo na Avenida Ipiranga às 4h da manhã. Cinto de segurança é um conceito que ele ainda não introjetou. Outra coisa típica do meu cônjuge é não usar gravata. Nem blusa de lã, nem casaco pesado. Nem roupa quente no inverno.

É um gaúcho com guarda-roupa de carioca. Ele também não usa perfume, nem anel, nem manta, nem chapéu. Óculos de sol, compra para perder dois meses depois. Ele não usa cores fortes, tecidos brilhantes, nem roupa com listras, nem gola rolê, nem roupa com logotipo. Ele não gosta de lojas.

Porém, é preciso arrancá-lo a força de uma livraria. Consulta médica, ele sempre esquece. Manteiga, só come com sal. Água, só toma com gás. Música, só canta errado. Mas é absolutamente afinado.

Como deu para perceber, comprar presente para o meu maridinho é bem difícil. Mas ele também não dá muita bola para presentes. Enfim, uma mania se compensa com outra. E, para dizer a verdade, eu gosto do moço do jeitinho que ele é. Agora, cascas de bergamota, cá entre nós: há um limite para tudo.

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