Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
segunda-feira, 14 de dezembro de 2009
14 de dezembro de 2009 | N° 16185
L. F. VERISSIMO
Os sórdidos detalhes
A minicâmera e o grampo telefônico ainda podem fazer mais pela moral na política do que toda a fiscalização e todos os mandamentos cristãos juntos. Supõe-se que depois dos escândalos recentes as pessoas fiquem mais cautelosas, ou mais reticentes.
Corruptos e corruptores continuarão a existir, mas não agirão nem falarão mais tão livremente, pelo menos não antes de procurar a câmera e o microfone escondidos. O que deve, no mínimo, retardar os negócios.
Os avanços da técnica revolucionaram o registro histórico. Imagine se quando o Kennedy foi assassinado já existissem as gravadoras e os celulares que hoje substituem as câmeras fotográficas até no aniversário do cachorro.
Em vez daquele precário filme em 8 mm do atentado, estudado e reestudado quadro a quadro na busca de vestígios de uma conspiração, haveria teipes e fotos de todos os ângulos e com todas as respostas, como a cara, o nome e o CIC dos possíveis conspiradores.
Mas a técnica pode empobrecer nossa percepção dos fatos. As grandes batalhas e os grandes eventos da era pré-fotográfica foram registrados em quadros épicos em que o artista ordenava a cena em função do efeito, não da verdade, ou não exatamente da verdade.
A Primeira Guerra Mundial não foi mais terrível do que muitas guerras anteriores, só foi a primeira guerra filmada, a primeira com a imagem tremida e sem cor, e por isso parece tão mais feia do que as guerras heroicamente pintadas. A guerra do Vietnã foi a primeira transmitida pela tevê, a primeira em que o sangue respingou no tapete da sala. Por isso deu nojo.
Até surgir a possibilidade de ser tecnicamente denunciado, o político corrupto podia contar com a condescendência do público. Mesmo quando não havia dúvidas quanto a sua corrupção, havia sempre a suspeita de que não era bem assim.
Sua culpa – até se ouvir sua voz gravada combinando a divisão dos milhões, ou ver sua imagem forrando os sapatos com dinheiro – era sempre uma conjetura. Imaginávamos o que acontecia nos bastidores do poder corrupto, mas era um pouco como imaginar uma orgia romana, ou visualizar uma orgia romana através da imaginação de um artista.
Agora não. Com a banalização do grampo telefônico e da minicâmera escondida, temos o que faltava no quadro. Temos o que enoja. Temos os sórdidos detalhes.
Sem o som e a imagem, a corrupção presumida poupa o suspeito. De certa forma, o imuniza. Transformou o Maluf, por exemplo, numa figura folclórica, o corrupto da aldeia, tratado até com um certo carinho.
Muitos outros sobreviveram politicamente a indiciamentos e denúncias porque faltaram o som e a imagem que os incriminariam. Faltaram os detalhes.
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