sexta-feira, 25 de dezembro de 2009



24/12/2009 e 25/12/2009 | N° 16196
NO TRONO DO PAPAI NOEL


Um aprendiz e dois mestres

Quatro colunistas do Grupo RBS foram desvendar como é a vida de um Papai Noel de shopping. A responsável pelo Informe Econômico, Maria Isabel Hammes, o comentarista Wianey Carlet, o colunista e editor de Opinião de ZH, Nílson Souza, e o narrador da Rádio Gaúcha Pedro Ernesto Denardin sentaram no trono do personagem do Natal para contar como é receber beijos, abraços e pedidos dos que sonham com a noite de 24 de dezembro.

Entre sustos e carinhos, relatos emocionantes.

Agora eu acredito em Papai Noel.Tive que fazer um estágio rápido com dois deles para me habilitar ao cumprimento de uma pauta tão desafiadora quanto gratificante nesta véspera de Natal.

Durante 40 minutos da tarde quente da última segunda-feira, sentei no trono do Papai Noel do Praia de Belas Shopping Center para receber pedidos e cartinhas, e também para administrar os medos e os sonhos das crianças.

Na véspera, preocupado em aprender os macetes do ofício, procurei o barbudo de plantão. Romeo Inácio Ramos Pereira da Costa, 61 anos, 16 de serviço no mesmo shopping, me recebeu com simpatia e foi logo avisando:

– Nosso trabalho é conquistar as crianças, sem forçar. Eu procuro fazer o que um pai ou um avô deveria fazer sempre: dar atenção. Se fizeres isso, não tem erro. Qualquer um pode ser Papai Noel.

Bem animador.

No dia seguinte, como combinado com a supervisora Rosana Rocha de Almeida, lá estava eu com um saco vermelho nas mãos, pronto para substituir o velhinho da hora, que já era outro.

O turno era de Laércio Roca, 66 anos, 42 de ofício, os 11 últimos no mesmo shopping. Ele me recebeu com a afetividade de um vizinho – e, na realidade, por total coincidência, é mesmo meu vizinho de bairro na zona sul da Capital –, prontificou-se a ceder-me o lugar e procurou me tranquilizar quando lhe disse que estava desatualizado em relação aos brinquedos infantis:

– Eles pedem muito carrinho Hot Wheels, Barbie Três Mechas, relógio Ben 10, essas coisas. Alguns falam até em inglês – me advertiu.

Fui me vestir no camarim do Papai Noel e das noeletes, que é como são chamadas as moças designadas para ajudar o velhinho. Elas fazem a parte mais delicada, acalmam os pequenos mais assustados, conduzem meninos e meninas até o trono e os colocam no colo do homem de barbas brancas, evitando que ele force demais a idosa coluna.

Quando eu já havia ajeitado a barriga falsa (necessária para os meus 64 quilos) e a barba postiça, Laércio chegou e me fez uma última advertência:

– Papai Noel nunca anda sozinho.

Dei o braço para a noelete Caroline Rocha Souza de Almeida, a Carol, 18 anos, estudante de Educação Física, e lá nos fomos escada rolante acima para a aventura da substituição. Ainda estava me sentindo um farsante quando passamos pela primeira criança que exclamou:

– Oi, Papai Noel!

Era comigo. Abanei timidamente com as minhas luvas brancas e armei um sorriso suado, que ninguém percebeu por baixo do bigode de algodão. Carol me levou até o trono e disse:

– Pode deixar que eu alcanço os pirulitos.

Jully Lima, de um ano e 10 meses, vestidinho rosa e faixa na cabeça, me olhava desconfiada do outro lado da fita que demarca os domínios do Papai Noel. Abanei para ela, fiz sinal para que se aproximasse, mas tudo o que ela fez foi agarrar-se nas pernas da mãe, a designer Alessandra Brandt Lima, de 38 anos. Acenei, então, com o pirulito.

Com o estímulo da mãe, ela se aproximou o suficiente para pegar o doce com a pontinha dos dedos, fazendo o possível para não tocar na assustadora luva branca. Em seguida, recuou rapidamente e me deu tchau.

“Não prometi brinquedo”

Minha primeira visita foi silenciosa. Depois, soube pela mãe que também fui o seu primeiro Papai Noel.

Veio Eduardo, um menino magro de quatro anos, sem medo algum. Sentou no meu colo e foi logo falando sobre sua vida, sua escola, respondendo com desenvoltura tudo o que eu perguntava. Perguntei-lhe se gostava de futebol e para que clube torcia:

– Sou vermelho! – ele me disse.

João Victor, de cinco, também passou pelo meu colo. Quase não falou. Só dizia sim e não. Uma menina loirinha de Serafina Corrêa me disse um nome que não cheguei a entender. Aí apareceram as irmãs Victoria, de sete anos, e Laysla, de cinco, para me entregar suas cartinhas e seus desenhos. Um deles mostrava um Papai Noel colorido sobre um trenó, com um sino nas mãos, duas crianças brincando na neve e uma legenda no verso: “Ro-rou”.

Me fez lembrar que eu não havia usado nenhuma vez as expressões tradicionais do Papai Noel. Ouvi os pedidos de outras crianças e, seguindo a orientação dos meus mestres, não prometi brinquedo para ninguém.

– A gente nunca sabe a condição social dos pais – me advertiu Romeo, um Papai Noel tão dedicado e sensível que chega a chorar quando fala de sua atividade.

Laércio, quando recebe pedidos de crianças carentes, leva as cartinhas para casa e procura atendê-las, arrecadando brinquedos e material escolar na loja maçônica de que faz parte.

Eles, com suas barbas naturais e extrema consciência do que representam para as crianças, são verdadeiros Papais Noéis.

Fiquei muito orgulhoso por me permitirem que ocupasse o seu trono por alguns minutos.

nilson.souza@zerohora.com.br

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