sábado, 12 de dezembro de 2009



13 de dezembro de 2009 | N° 16184
MOACYR SCLIAR


Os terapeutas

De terapeuta, de poeta e de louco todos nós temos um pouco. O terapeuta que, em maior ou menor grau, existe em nós dispõe-se a ajudar as pessoas que sofrem, que estão em dificuldades. Não é preciso um consultório ou uma sala cirúrgica para fazer isso; basta saber escutar com atenção e simpatia, basta dizer uma ou outra palavra de apoio, e pronto, fizemos algo por nossos semelhantes.

Há profissões que facilitam esse trabalho, digamos assim, de terapia improvisada. O barman é um exemplo clássico, como a gente constata nos filmes americanos mais antigos. Lá está o homem, atrás do balcão, caracteristicamente secando copos com uma toalha. É um sujeito de meia-idade, de fisionomia neutra, incaracterística.

Entra um homem, toma assento num tamborete junto ao balcão. Sua aparência mostra que ele está passando por problemas: está vestido desleixadamente, a gravata aberta. Sua expressão é de alguém que sofre, que está preocupado.

Pede uma bebida, depois outra, e começa a falar, primeiro de maneira geral (“É uma vida dura, essa”) e aos poucos vai contando o que se passa: ou foi despedido, ou está para se divorciar, ou brigou com o melhor amigo. Fala, fala.

O barman, sempre secando copos, escuta, impassível. É só isso que ele faz: escuta. Não dá conselhos, não diz o que fazer. Escuta, apenas, mas ao escutar está dando ao cara que sofre uma grande ajuda. Porque, em nosso mundo, há mais pessoas querendo falar, sobretudo sobre si próprias, do que querendo ouvir: é uma época que cultua o ego. Daí a importância do homem do bar.

Mas há outros que não se limitam a escutar, que ajudam de forma mais objetiva. É o caso do mecânico (alô, Joaquim, isto é uma homenagem para ti). Porque o carro é mais do que o veículo que nos transporta.

Ele é uma extensão do nosso corpo, e uma extensão que nos dá poder: é só ver a quantidade de pessoas que voam pelas estradas. Quando o carro estraga, nós nos sentimos ameaçados. É quase como se estivéssemos doentes.

E é aí que entra o mecânico. Trata-se de um técnico, de uma pessoa que nos fala objetivamente, e é isso que nos ajuda. Quando o mecânico diz que tem de trocar uma peça, podemos não gostar (sobretudo se fôr uma peça cara), mas sabemos que esta é uma indicação precisa, incontestável. E até lamentamos que em nossa vida indicações semelhantes nem sempre podem ser feitas.

Para completar o elenco de três (que é, como sabemos, um número mágico) eu colocaria o homem da ferragem. A maioria das pessoas quando vai a uma ferragem sabe exatamente o que quer.

Mas existem pessoas indecisas, vacilantes, que não conseguem nem expressar adequadamente a sua necessidade: “Eu preciso de uma pecinha… Aquela coisinha, não sei como se chama…

Aquela que segura aquele fio…”. E aí começa o diálogo com o cara da ferragem, que na maioria das vezes termina com um final feliz: a pecinha é localizada e o cliente sai da loja triunfante, convicto de que ainda dá para confiar na humanidade. Dá mesmo.

Quem seria capaz de combinar uma história policial com humor irresistível? O Verissimo, claro. Não percam Os Espiões.

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