04 de novembro de 2014 | N° 17973
FABRÍCIO CARPINEJAR
Efeito
colateral da mulher romântica
A mulher romântica tem um efeito colateral: não perdoa. Não
perdoa mesmo.
Ela não esquecerá qualquer mancada que você tenha feito.
Pode recorrer ao exorcismo, afogar Santo Antônio, investir o salário em
macumba.
Nada apagará a ofensa de sua memória. Nada amansará sua dor.
O tempo não desgastará a mágoa, é tudo como se fosse ontem.
Ou melhor, hoje de manhã.
Não existe atenuante, não existe a tecla Delete, não existe
nem condenação a serviços comunitários.
A idealização, quando machucada, traz a intransigência. Não
encontrará mais rascunhos na idealização.
A partilha, antes bênção dos elogios, será calvário das
acusações.
Para a mulher romântica, a memória tem uma única vida, como
o vestido de noiva. Não há maneira de reaproveitá-la.
Uma falsidade, ainda que eventual, tornará o resto inteiro
falso, criando a suspeita do engano permanente.
Ela se lembrará da tristeza pela relação inteira. Sempre
voltará ao assunto, sempre trará o ressentimento à baila.
A mácula se transformará num quartinho proibido e assombrado
da convivência, a mancha fechará a porta da espontaneidade.
Você pensa que, por ser romântica, ela é tapada. Você pensa
que, por ser romântica, ela é dependente e frágil. Você pensa que, por ser
romântica, ela aceitará qualquer coisa. Você pensa que, por ser romântica, ela
terá compaixão. Enganou-se redondamente.
Você confundiu romantismo com amor incondicional, este é o
seu engano.
Toda mulher romântica, por mais que se esforce, jamais
perdoa qualquer deslealdade ou infidelidade.
O homem pode se retratar diante da família e dos amigos,
arrepender-se publicamente, rastejar no chão da cozinha, subir escadarias de
joelhos, prometer ser perfeito dali por diante: não adianta.
Mulher romântica apenas é boa quando você não pisa na bola.
Depois da falha, ela será um inferno.
Como ela é devota, sensível e dedicada, qualquer sofrimento
pesa duas vezes mais. A ferida dói o dobro.
A mulher romântica não tolera mentira.
Desde o início da relação, só faz uma exigência: a
sinceridade.
Quando quebrada a sinceridade, ela não acreditará mais.
O conto de fadas não tem como ser refeito. O encantamento
some, e o poder das juras desaparece. É agora falar para o vento e viver casado
com a tempestade.
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