quinta-feira, 11 de junho de 2009



11 de junho de 2009
N° 15997 - LUIS FERNANDO VERISSIMO


Revisionismos

O passado não é um lugar seguro. Volta e meia aparecem revisionistas querendo mudar tudo, abalando antigas certezas e dizendo que o acontecido não aconteceu, ou não aconteceu bem assim.

História, já se disse muito, é versão, mas gostamos de pensar que alguns fatos do passado são fatos mesmo e não interpretações convenientes. Os revisionistas não permitem. A função deles é não deixar o passado em paz. E sugerir que há sempre a possibilidade de uma versão nova para um fato velho.

As repetidas comparações do Obama com o Roosevelt provocaram uma reação nos Estados Unidos, segundo a qual não apenas o Baraca tem pouco a ver com o Roosevelt histórico como o próprio Roosevelt tem pouco a ver com o mito que se formou em torno do seu governo.

Segundo a história – ou o mito, para os revisionistas –, Roosevelt pegou um país arruinado pelos desmandos de um capitalismo fora de controle durante o governo Hoover, enfrentou os cachorros grandes das finanças e do conservadorismo e, com programas sociais acusados de bolchevistas, subsídios para a produção acusados de antiamericanos e uma mobilização popular acusada de populista e coisa pior – embora fosse um aristocrata – salvou os americanos.

Os revisionistas dizem que muitas das medidas contra a crise dos anos 30 já tinham sido tomadas por Hoover, que até agora era o grande vilão da história, que Roosevelt aliou-se aos cachorros grandes, convencendo-os a aceitar seu pseudossocialismo com o argumento de que, além de salvar os Estados Unidos, estava salvando o capitalismo, e que no fim sua política intervencionista não estava dando muito resultado.

Um adendo inescapável à versão revisionista, nem sempre, compreensivelmente, citada, é que não foi a mobilização do New Deal de Roosevelt que tirou o país da crise, foi a mobilização para a II Guerra Mundial.

O tempo é aliado do revisionismo. Com o tempo, os fatos ficam maleáveis, como que mergulhados em solvente. Além de facilmente moldados, adquirem uma neutralidade que os absolve.

Faz muita diferença, hoje, saber como o Simonal se comportou durante a ditadura? Se o revisionismo concluir que a única posteridade que ele merece é a de um bom cantor, está sendo justo. Enquanto isto, como a própria ditadura se comportou naqueles anos está posto a salvo de qualquer discussão, revisionista ou não.

Nenhum comentário: