segunda-feira, 15 de junho de 2009



15 de junho de 2009
N° 16001 - PAULO SANT’ANA


Os simples

Um leitor, de sobrenome Sander, me mandou, parece-me que de Santo Cristo (RS), um pensamento que achei genial sobre a tentativa em curso de extinguir-se as carroças e os carroceiros em Porto Alegre: “Uma só família muitas vezes possui cinco carros e ninguém discute se isso é ou não prejudicial ao trânsito de uma cidade.

Por outro lado, uma carroça, que talvez sustente cinco famílias, esta virou um problema de tamanha monta, que, para muitos, a sua extinção se impõe. É uma completa inversão de valores!!!”.

Faço minhas estas últimas palavras do leitor.

O Clóvis Malta e a Suzete Braun localizaram aquela coluna que o Ibsen Pinheiro elogiou como uma das melhores que até hoje escrevi. Ei-la:

Ontem tirei a tarde para fazer uma coisa que deveria fazer todas as semanas: passear por diversos arrabaldes de Viamão. Se há um município arborizado, ligado umbilicalmente ao verde, encravado na natureza, é Viamão. E me entretém ver como vivem as pessoas pobres ou de classe média baixa, como se refestelam na felicidade de desfrutarem das coisas simples.

Uma sombra sob copada árvore, jogando cartas enquanto a carne do churrasco é assada, uma cervejinha gelada, as crianças brincando ao redor, as mulheres fazendo as saladas, mexendo feijão, cozinhando o aipim, o domingo ensolarado atirando as pessoas para os pátios alegres, as famílias reunidas. Do casario desparelho das ruas semicalçadas emerge uma atmosfera de paz e amizade.

É fascinante ver o pobrerio e a mediania construírem as suas vidas lá longe. As casas sendo erguidas de improviso, depois crescendo de puxado em puxado. Pode não haver telefone fixo, mas sempre algum parente traz um celular, a Corsan põe água em todos os recantos, há luz e há gás para iluminar as casas e acender os fogões, o IPTU é barato, eles vão lutando para sustentar essas pequenas despesas com dificuldade, mas não abdicam de serem felizes, espalham-se pelos quartos das casas, as filhas casam-se e continuam morando com os pais, há sempre lugar para mais um genro emergente.

É lindo de ver como as pessoas sobrevivem alegremente, sem queixas. A maioria delas é assalariada, grande parte de empregadas domésticas, outros são operários ou trabalham no setor de serviços, todos ganhando salários aviltantes, o dinheirinho é contado, mas são felizes, se reúnem, em cada casa se forma um mutirão social, um dia um paga a comida, o outro compra o gás, as casas são limpas e há sempre alguém que é capaz de realizar os pequenos consertos, as pinturas, há uma democracia nas vilas porque as pessoas de bem tendem a se juntar e a se solidarizar.

Como é comovente a felicidade trivial das pessoas pobres e lutadoras, como são simples os seus anseios, como são singelas as suas vidas e como são gregários e repletos de camaradagens os seus domingos.

Que povo heroico o brasileiro. Ele tem a vocação de se manter erguido em famílias.

Na segunda-feira, os homens partem de manhã cedinho para seus subempregos, umas mulheres vão junto, que hoje é preciso somar os ganhos de todos para sustentar a casa, às vezes até as crianças trabalham.

E voltam para casa somente à noite, reúnem-se em torno dessa diversão barata e segura que é a televisão. São refugiados em suas cidadelas das ruas perigosas que teimam em fazer cada vez mais vítimas entre nós.

Comove-me a vida dura e prosaica das populações arrabaldinas. Foi a forma enjambrada que eles acharam para sobreviver e tentar ser felizes.

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