Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
terça-feira, 23 de junho de 2009
23 de junho de 2009
N° 16009 - LUÍS AUGUSTO FISCHER
Meus mortos
Num livro meu que prezo muito mas quase não teve leitor, chamado Contra o Esquecimento, reunindo crônicas, eu inventei uma seção chamada Meus Mortos. Ali estão alinhadas, em assembleia permanente, evocações de gente que apreciei muito. Apreciei e aprecio ainda, por isso ali estão.
Esses dias, falando sobre Montaigne, lembrei que ele começou a redigir seus Ensaios depois da morte de um grande amigo,
Etienne de la Boétie. Montaigne chega a dizer que só escreveu o que escreveu porque não tinha mais o grande interlocutor de sua vida. Era um morto seu, que ele carregou consigo, para sempre – não como exercício de morbidez, mas como companhia. Uma querida amiga, Lúcia Serrano Pereira, ao ouvir meu relato, fez uma síntese esplêndida: o texto dos Ensaios carrega uma falta consigo, e essa falta é o lugar por onde entra o interlocutor, o leitor do texto.
Carregar uma falta, linda e precisa imagem. Eu carrego algumas dessas faltas, e espero que o leitor me acompanhe; nossos mortos não são os mesmos, o leitor tem lá suas evocações, eu cá tenho os meus mortos, antes de todos meu irmão, Sérgio, o Prego, que se foi dois anos atrás. Mas nos encontramos, o leitor e eu, nossos mortos e nós, aqui, na memória, no texto que lembra, neste meu, manso e um pouco triste, ou num texto poderoso, o de Montaigne, ou no de Nelson Rodrigues, que fez da morte um elemento de composição e de força.
Pois agora acrescento à companhia o Frei Rovílio, falecido uns 10 dias atrás. Grande e doce figura, de uma mansidão tocante, editor eficiente, pesquisador de relevo, ele tinha outros méritos, que talvez seus superiores hierárquicos nem gostem muito de lembrar, porque confrontam a ortodoxia católica: ele por exemplo abençoava segundos matrimônios de católicos, coisa que a Igreja se recusa tolamente a fazer; como lembrou um amigo comum, ele atendia confissões pelo telefone, oferecendo um consolo pela via tecnológica. Estava certíssimo o Frei Rovílio.
Como certíssimo esteve outro morto recente, Benno Wendling, agricultor e professor (e com o mesmo prenome do meu saudoso avô paterno, alfaiate e colono da terra). O prezado leitor talvez não o tenha conhecido nem de longe, mas precisa saber que se tratava de um valoroso guardador da memória: por muitos anos, ele escreveu – a mão – a história de sua minúscula terra, um distrito de Morro Reuter, Walachai, e foi objeto de um curta-metragem sensível, dirigido por Rejane Zilles.
O professor Benno fez o que tinha que fazer, e agora qualquer leitor pode entrar naquele mundo, pela falta dele, por sua presença escrita.
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