sexta-feira, 26 de junho de 2009



Suor anônimo na garoa

De vez em quando até a Gisele Bündchen, o Lula, o massagista da Juliana Paes e os fotógrafos da Playboy devem reclamar do emprego que têm. Até o comprador de filmes da Globo que viaja para os Estados Unidos ou o diretor cultural da Fundação Cultural Banco do Brasil são capazes de se lamentar pelo cansaço do trabalho.

Nesse Brasil de impunidade, má distribuição de renda e mordomias federais, estaduais e municipais, fico pensando nos dois operários que não estavam se queixando da vida e do trabalho.

Era segunda-feira, sete e vinte da matina, uns dez graus de frio sulino, garoa caindo direto nos pescoços dos dois homens que, literalmente, quebravam rochas enormes, com talhadeiras, marretas e martelos. Trabalho duro, início de obra, água, barro, alicerce. Proteção? Nada de macacões ou capas. Um dos peões estava sem luvas.

Apenas capacetes cobriam os cabelos suados deles, que, ao menos naquele momento trabalhoso, não falavam em melhores salários, greves ou condições de trabalho adequadas.

As poucas palavras que trocavam eram sobre futebol, mulheres, política, temperatura, mestre de obra e a dureza dos blocos de basalto que cortavam em cubos, que depois empilhavam no fundo do canteiro da construção do edifício. Edifício fino, no qual certamente não entrarão depois que os apartamentos dos doutores estiverem prontos.

Os dois operários trabalhavam anônimos, afanosamente, sem precisar de câmeras de tevê, olhos do dono da obra ou de algum poema do Vinícius de Moraes ou do Chico Buarque. Muito menos estavam necessitando de algum filme patrocinado pela Petrobrás para cumprir suas tarefas ou do apoio de algum fiscal do Ministério do Trabalho.

Os tapumes do empreendimento e as janelas vazias dos prédios dos lados garantiam aos dois trabalhadores sem plateia, vaidade, elogios ou palmas. Aqueles dois pedreiros não levariam quarenta minutos para cimentar um túmulo, feito o coveiro de Tancredo Neves, naquela transmissão inesquecível e arrastada da tevê.

E nada de crônica do Luis Fernando Verissimo, Zuenir Ventura ou Carlos Heitor Cony para eles.

O máximo que os dois trabalhadores conseguiram em matéria de mídia foi um texto de um modesto cronista municipal, meio metido a cronista estadual, vá lá, que, na hora, inspirado pelos trabalhadores de construção, pensou que a missão de construir com palavras pode registrar e resgatar um momento de boa e digna "pequena história" popular brasileira.

Um momento que dá esperança de futuro decente e limpo, mesmo diante de tudo o que está sempre acontecendo aí no Senado, Câmara e outros locais sinistros da vida.

Jaime Cimenti

Ótima sexta-feira - Excelente fim de semana

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