sábado, 27 de junho de 2009



A tecnologia ficou invisível

Os aparelhos eletrônicos serão embutidos em roupas e objetos. Estarão até dentro de nós. Alguns facilitarão nossa vida. Outros vão espreitar nossos movimentos
Fabiana Monte



Você acorda para trabalhar. No banheiro, o espelho indica seu peso, sua idade, o nível de colesterol e a pressão sanguínea informados por sensores implantados em seu corpo. Também mostra a série de exercícios físicos que você deve fazer para manter seu organismo saudável. Na cozinha, sua mãe prepara o café. A geladeira apresenta os produtos cujo prazo de validade está chegando ao fim e envia para o mural digital da cozinha a lista de itens que devem ser comprados.

O equipamento, com tela sensível ao toque e webcam integrada, também exibe fotos de seus amigos e parentes. É o aniversário de seu tio que mora no exterior. Você grava um vídeo desejando felicidades. Com a ponta do dedo, arrasta o arquivo até a foto do aniversariante. Pronto, a mensagem é enviada para o e-mail de seu tio.

Já no carro, você se dá conta de que esqueceu o endereço da reunião marcada para esta manhã. Com um comando de voz, seus e-mails aparecem no display do carro. Ao selecionar o endereço com o toque do dedo, o GPS indica o melhor caminho a seguir. Coisa de filme? Em alguns anos, sua rotina poderá ser assim.

A promessa que a ciência e a evolução tecnológica trazem para a humanidade é de um futuro conectado. Uma conectividade, garantem cientistas e estudiosos, bem diferente daquela à qual estamos acostumados atualmente.

Na próxima década, chips deverão estar presentes em sapatos, carteiras, gravatas, canetas, batons, em seu corpo e sob sua pele. Tudo terá inteligência e estará conectado. “A palavra ‘computador’ vai desaparecer, porque tudo será computador”, diz Jean Paul Jacob, pesquisador emérito da IBM que foi contratado há 46 anos pela empresa para o cargo de futurólogo da companhia americana. Como essas mudanças vão afetar nossa vida?

Algumas das facilidades descritas na abertura desta reportagem (como a geladeira com internet) são prometidas há anos pela indústria, sem nunca passar do protótipo. Mas um número crescente de produtos inovadores já está sendo produzido. Eles mostram como é possível incorporar a capacidade computacional a objetos e equipamentos que vão além de laptops, GPS (Global Positioning System), celulares multifuncionais e sensores usados por atletas para controlar batimentos cardíacos e velocidade de corrida.

O próprio conceito de chip passará por mudanças. Deixará de ser feito de silício. Henrique Eisi Toma, coordenador do laboratório de nanotecnologia molecular da Universidade de São Paulo (USP), diz que a ciência vive um momento semelhante à transição da válvula para o transistor.

A nova geração de chips será construída em nanoescala. Seus componentes serão tão pequenos – mil vezes menores que as dimensões atuais – que serão construídos molécula por molécula. “A nanoescala, ao contrário da microescala – que ficou restrita à eletrônica –, vai mexer com tudo da sociedade”, diz Toma.

Uma das promessas para a área de saúde é o protótipo da iPill, da Philips, uma pílula inteligente criada para tratar doenças do aparelho digestivo como colite e câncer do cólon. O remédio é capaz de identificar a região do trato intestinal em que está alojado (devido às diferenças do nível de acidez entre o estômago e áreas do intestino) e liberar doses pré-programadas de substâncias para combater o mal.

A cápsula de 26 milímetros tem microprocessador, bateria, sensor de acidez, transmissor de rádio, termômetro e uma bomba para liberar os medicamentos. Ela se comunica com uma unidade controladora fora do corpo por meio de rádio, informando a temperatura local. O microprocessador controla a administração da droga, que é liberada pela bomba da cápsula, segundo as prescrições do médico.

Os aparelhos tradicionais também vão adquirir formas mais dinâmicas. Um dos desafios é aprimorar o equipamento mais íntimo e multifuncional que usamos hoje: o celular. Centros de design da Motorola na Coreia, na China, no Reino Unido, na América do Norte e na do Sul desenvolveram um estudo que apresenta 12 conceitos de como serão os telefones móveis em 2033.

Segundo eles, diversos objetos que temos à mão, como chaveiros, anéis, pulseiras, relógios e porta-retratos, ganharão funções de comunicação, hoje restritas ao telefone e ao computador. Nós os usaremos alternadamente, segundo nossa conveniência.

Um protótipo da empresa, o Metamorfose, feito com material flexível, mudará de forma, tamanho e funções a um simples chacoalhar de mãos. Ele poderá ter o formato de telefone, de um cartão de crédito ou de uma tela.

É um conceito parecido com o do Morph, da Nokia, que também prevê que o material plástico do aparelho será autolimpante. As empresas ainda não têm tecnologia para construir tais equipamentos, mas acreditam que o design deverá seguir esse caminho.

Aparelhos tão surpreendentes terão novas formas de se comunicar conosco. Hoje, dependemos de teclados, botões ou mouses para comandá-los. Isso vai mudar. O Projeto Natal, da Microsoft, dá algumas dicas de como poderá evoluir essa nova relação. Composto de sensor de movimentos, câmera e microfones acoplados ao videogame Xbox 360, o aparelho inova por não ter controles. Você usa o próprio corpo para interagir com o console.

O sistema usa um sensor para monitorar o movimento do corpo do jogador, sua face e voz. O produto ainda não tem data para ser lançado. Mas a fabricante de brinquedos Mattel começou a vender em fevereiro um brinquedo que usa a força da mente. O desafio do jogo Mind Flex é fazer uma bola ultrapassar obstáculos em uma base.

Para isso, o jogador veste uma espécie de fone de ouvido, com sensores na testa e nos lóbulos das orelhas. Eles medem os impulsos elétricos dos neurônios do jogador e identificam seu nível de concentração. Quanto mais concentrado ele estiver, maior será sua capacidade de controlar o movimento e a velocidade da bola.

A Mattel lançou um jogo em que você controla uma bolinha com a força do pensamento

A perspectiva dos pesquisadores é que a comunicação com as máquinas venha a ser mais natural. Hoje, eles estudam como os aparelhos podem entender melhor nossas ordens e nossos humores. É o que fazem os 50 pesquisadores e professores da Tauchi (Unidade de Interação entre Homens e Computadores da Universidade de Tampere), na Finlândia.

Eles estudam técnicas para acessar informações e aplicações exclusivamente por meio da visão. Seu principal uso, por enquanto, é permitir a comunicação de pessoas que sofrem de deficiências motoras. Mas as funções podem evoluir para outros públicos.

Kari-Jouko Raiha, coordenador da Tauchi, acredita que os computadores ganharão mais independência ou autonomia para tomar ações sem que você precise dar um comando. A Tauchi desenvolveu um programa que monitora a movimentação dos olhos enquanto você lê um texto em idioma estrangeiro.

A invenção combina software com um equipamento chamado “eye tracker”, uma pequena câmera de vídeo com uma fonte de luz infravermelha que ilumina o olho para monitorar sua movimentação.

O pesquisador afirma que o padrão de movimentos da visão muda quando deparamos com uma palavra desconhecida. E o sistema é capaz de identificar essa alteração, informando a tradução da palavra, sem que você precise solicitá-la previamente.

Outro projeto do instituto finlandês está ligado a sistemas capazes de reconhecer e se adaptar a mudanças emocionais do usuário. Eles também são compostos de software e do “eye tracker” e poderiam ser usados em escolas.

O sistema perceberia quando os alunos deixassem de prestar atenção ao conteúdo e realizaria as mudanças necessárias para reconquistar os estudantes.

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