quinta-feira, 20 de janeiro de 2022


20 DE JANEIRO DE 2022
QUASE MEIO MILHÃO DE REAIS

Aras libera ganho extra a procuradores

Duas decisões tomadas no fim de 2021 pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, permitiram que procuradores recebessem valor extra de quase meio milhão, em dezembro. As decisões custaram ao menos R$ 79 milhões aos cofres do Ministério Público da União, segundo dados do Portal da Transparência. A Procuradoria-Geral da República (PGR) informou que os pagamentos foram feitos porque houve diminuição dos gastos durante os meses mais críticos da pandemia, o que garantiu excedente no orçamento.

A Constituição limita o pagamento de salários no funcionalismo ao que ganha um ministro do Supremo Tribunal Federal: R$ 39,3 mil. Em alguns casos, órgãos públicos conseguem driblar a regra ao incluir vantagens recebidas como verbas indenizatórias, que não entram nesse cálculo.

Em 2017, o Conselho Nacional do Ministério Público permitiu que licenças-prêmio - descanso remunerado por até três meses a cada cinco anos trabalhados - fossem convertidas em valores no contracheque, mesmo ultrapassando o teto salarial. No Congresso, proposta que regulamenta os pagamentos acima do teto no Judiciário, no Executivo e no Legislativo aguarda há mais de cinco anos para ser votada. Após passar no Senado, em 2016, a medida nunca foi analisada pela Câmara.

Antecipação

No Ministério Público da União, os pagamentos foram possíveis porque, a poucos dias do recesso no Judiciário, Aras abriu edital permitindo que procuradores solicitassem, de uma só vez, o recebimento em dinheiro de licenças- prêmio acumuladas há anos. Com a autorização, quem tinha folgas para gozar pôde converter esses dias em dinheiro no contracheque de dezembro. A prática é incomum em empresas privadas, nas quais horas extras ou dias a mais trabalhados são transformados em valores pagos ao funcionário só quando há aposentadoria ou demissão.

Portaria de Aras também determinou o pagamento antecipado das férias deste ano. O resultado foi que um grupo de 675 procuradores recebeu cifras acima de R$ 100 mil em dezembro.

O maior contracheque foi do procurador regional José Robalinho Cavalcanti, que tem salário base de R$ 35,4 mil, mas obteve R$ 446 mil em rendimentos brutos, naquele mês, a partir de indenizações e outros penduricalhos.

Questionado, Robalinho destacou que o pagamento de todas as indenizações a que os procuradores fazem jus, em um único contracheque, nunca havia ocorrido em outros momentos de sua carreira.

- Essa questão das férias foi questão pontual, excepcional, porque não foi possível gozar férias por interesse do serviço. Isso é coisa raríssima. No meu caso, em 22 anos de Ministério Público, isso só aconteceu agora. Isso não acontece a torto e a direito. Só que também são pouquíssimos os que têm situações limite de serviço para que isso aconteça - afirmou.

Segundo na hierarquia da PGR, o vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet Branco, recebeu R$ 332 mil em dezembro entre remunerações e indenizações. Procurado, disse que não participou da elaboração dos atos e atribuiu os valores aos seus 40 anos de funcionalismo público.

Crítica

Professor de Direito Trabalhista da Fundação Getulio Vargas, Paulo Renato da Silva disse que as decisões de Aras precisam ser analisadas sob ponto de vista dos princípios da legalidade e da moralidade:

- Licença-prêmio é uma coisa que não faz sentido, já deveria ter acabado. São arranjos que o legislador vai fazendo à mercê de interesses políticos e do lobby. Isso vai produzindo na legislação um monte de penduricalhos com verbas muito expressivas.

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