15 DE JANEIRO DE 2022
MONJA COEN
LUA
Estamos no quarto crescente. Segunda-feira é lua cheia. A primeira do ano. Se a noite for clara, olhe para o céu, aprecie e recite: Todo carma prejudicial alguma vez cometido por mim.
Desde tempos imemoriáveis
Devido à minha ganância, raiva e ignorância sem limites
Nascido de meu corpo, boca e mente
Agora, de tudo, eu me arrependo
O arrependimento nos leva à grande pureza. Reconhecer nossas faltas e comprometer-se a não as repetir. Transformar-se. Não é tarefa fácil. As mudanças emocionais/espirituais não acontecem em linha reta, mas em uma espiral ascendente. Algumas vezes derrapamos e retrocedemos. Que seja apenas para tomar força e ir adiante. Essa é a proposta do arrependimento nas luas cheias e luas novas. Hoje em dia, nos mosteiros japoneses que já não seguem mais o calendário lunar, essa liturgia do arrependimento é feita nos dias 15 (este sábado) e nos dias primeiro de cada mês - ou seja, de quinze em quinze dias precisamos rever nossas ações, palavras e pensamentos para estimular o que é benéfico e impedir o crescimento do que é prejudicial.
Meu nome budista é mente lua só e completa: Shingetsu Coen. Shin significa espírito/mente/coração/essência e Getsu (lê-se guetsu) significa lua.
No Japão, na lua, não há um dragão sendo morto por São Jorge.
Dragões são seres imaginários representantes das águas. E o tigre - animal símbolo deste ano, no calendário chinês, é o símbolo da terra.
No filme Pocahontas, um pequeno dragão era o protetor dos ancestrais da família. Lembram-se dele? Um dragãozinho atrapalhado? Pois, dragões não devem ser mortos...
Quem aparece na lua cheia japonesa é um coelho, em pé, amassando arroz em um pilão, com um machado de madeira enorme. Por isso, em janeiro, primeiro mês do ano, é uma delicadeza servir bolinho de arroz.
Simboliza o trabalho feito durante o ano - semear, plantar, cultivar, cuidar, colher, separar e cozinhar. Ou seja, precisamos um ano inteiro de trabalho, de atenção para termos alimento.
O arroz gaúcho de grão curto é o mais parecido com o arroz japonês. Podemos cozinhar só com água e fica delicioso.
Quem planta arroz sabe o trabalho que envolve para uma boa colheita. Ainda há agricultores que usam o método antigo, manual. Nos arrozais de água sempre aparecem sapos falastrões e seus predadores, as cobras.
Bem, voltando ao meu nome: Shingetsu poderia ser traduzido como "mente lua". Seria ter a cabeça na lua? Distraída? Sonhadora? Entretanto, vem de um poema chinês antigo:
Mente lua Só e completa
A luz permite ver todas as formas Quando formas e luz são transcendidas
O que é? Questão existencial. O que é, o que existe além da luz e das formas? Qual a essência do ser?
A lua é uma só, completa em si mesma. Lua cheia, lua nova, quarto crescente ou quarto minguante - sempre o círculo perfeito - quer visível ou invisível.
Assim é o nosso eu verdadeiro, a essência de cada ser humano. Assim como é. Algumas vezes visível outras invisível. O que move você? Posição social, fama, reconhecimento, dinheiro? Ou a ternura de uma vida simples e singela?
Há um filme lindo a ser lançado este mês no Brasil.
Um filme do Butão. Belíssimas imagens e um roteiro sensível, macio, doce sobre a felicidade interna bruta. Um país onde ser feliz é mais importante que ser rico ou poderoso. De uma delicadeza indescritível. Povo simples de montanha, capaz de cantar e oferecer o canto para o bem de todos os seres.
Qual é o seu meio de vida?
Matar dragões ou plantar arroz e amassar no pilão?
Além do silêncio e do som, da luz e da forma - o que é?
Mãos em prece
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