24 DE JANEIRO DE 2022
CÍNTIA MOSCOVICH
Não se pode educar sem leitura
A história que vou contar se passou nesses tempos de pandemia e envolve uma escritora de livros para o público juvenil e uma esforçada professora de um colégio particular de uma próspera cidade do interior do Estado.
A escritora foi consultada pela professora sobre a possibilidade de conversar com os alunos numa videoconferência e sobre, claro, os custos envolvidos. A escritora respondeu que não queria cachê, que lhe interessava que os alunos comprassem seus livros. A professora respondeu que sentia muito, mas que os pais sempre haviam resistido a comprar livros para as crianças e que, com a pandemia de coronavírus, alcançaram justificativas de toda ordem: até medo de contaminação chegaram a alegar.
Surpresa, minha amiga disse que, se a posição dos pais era aquela, não entendia o que a professora esperava que ela fizesse. A professora tentou argumentar que havia anos tentava que os alunos lessem literatura de qualidade mas que eles só consumiam as obras disponíveis na Internet, muito fraquinhas. A professora explicava, ainda, que conhecer autores poderia estimular os alunos a boas leituras, ela queria ler por videoconferência um dos livros da escritora - o colégio podia oferecer uns cem reais para tal conversa. Minha amiga recusou a proposta.
Não dá para saber da vida financeira de ninguém, mas é seguro que não se pode educar sem livros. É óbvio que os pais dessas crianças querem filhos bacanas, que tenham opiniões próprias, que sejam gente que se relacione, que crie vínculos, que tenha trabalho - tudo isso sem passar ridículo ou vergonha.
Não se sabe como esses pais conseguirão isso de seus filhos, já que o exemplo que dão é pouco estimulante e que o horizonte oferecido às crianças não passa do muro da esquina.
Pobre professora, que tem que lidar com a mediocridade avarenta dos lares abastados.
Esta coluna foi publicada no Segundo Caderno de 31 de maio de 2020.
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