22 DE JANEIRO DE 2022
CRISTINA RANZOLIN INTERINA
Alô, amigos!
Alô, amigos! Era sempre com essa saudação que meu pai começava os bate-papos com seus ouvintes.
Ele realmente considerava seus ouvintes grandes amigos e para eles procurava sempre dar o seu máximo em frente aos microfones. Foi assim desde o início, lá nos anos 50 na Rádio Diário da Manhã de Lages, Santa Catarina, nas narrações esportivas na Rádio Difusora, nos tempos da Farroupilha, depois na Rádio Guaíba, onde trabalhou muitos anos até chegar à Rádio Gaúcha. Foi nela que se aposentou, já há 15 anos.
Como narrador esportivo esteve em seis Copas do Mundo, narrou campeonatos nacionais e internacionais, jogos com Pelé em campo, muitos Gre-Nais e também jogos bem menos importantes. Mas isso não interessava, ele se preparava para qualquer jogo como se fosse uma grande final, e a vibração e a emoção eram sempre as mesmas.
Como jornalista, fez a cobertura de diversas eleições, de fatos históricos que foram destaque na imprensa nacional e internacional, entrevistou grandes personalidades, sempre com muita dedicação e profissionalismo. Além disso, foi diretor de várias rádios por onde passou. Os mais de 50 anos de carreira fizeram com que aqueles que ele chamava de amigos também acabassem considerando o Ranzolin um grande amigo, ou até alguém da família.
E é para essas pessoas que resolvi escrever hoje. Muitos, mesmo depois de tanto tempo, não entenderam a sua aposentadoria e perguntam por onde ele anda e por que sumiu. Outros quando veem uma postagem com fotos de minha família nas redes sociais questionam por que ele não está ali...
Infelizmente, meu pai tem Alzheimer, essa doença danada que no início provoca esquecimentos, aos poucos vai roubando a memória e depois vai trazendo outras complicações e limitando cada vez mais os pacientes. Dizem que para evitá-la é preciso ser ativo, manter a cabeça em funcionamento. Mais do que ele fez?
Nós, da família, nunca tivemos a intenção de esconder nada sobre ele. Afinal, não é feio ficar doente, às vezes acontece mesmo quando se faz prevenção. Mas acho que nunca falamos publicamente sobre o assunto... Depois das minhas férias, caminhando nas areias de Torres e sendo tantas vezes abordada por pessoas que me perguntaram sobre ele, resolvi aproveitar essa oportunidade para abordar o assunto. Acho que os milhares de amigos que ele fez na vida merecem saber como ele está.
E já adianto: bastante limitado. A voz linda e inconfundível que tantas histórias narrou não sai mais, as pernas que para tão longe o levaram nas suas coberturas jornalísticas não permitem que ele dê mais nenhum passo. Me perguntam se ele me reconhece, e eu digo: "Às vezes". Mas o que importa é que eu sei que ele é meu Pai e procuro me fazer presente o máximo possível ao seu lado, dando-lhe carinho, dizendo o quanto eu o amo, fazendo uma massagem no seu corpo ou até cantarolando no seu ouvido. Porém, vê-lo sem poder curtir a vida, como ele fazia com tanta alegria, dói demais. Minha mãe, eu e meu irmão fazemos todo o possível para que ele tenha conforto, estamos sempre atrás de tudo que possa lhe dar melhor qualidade de vida e bem-estar, mas sempre ficamos longe do que realmente gostaríamos de dar para ele.
Aqueles que tiveram a oportunidade de ser seus colegas ou de conviver com Armindo Antônio Ranzolin sabem que, além do profissional dedicado e de grande sucesso, que vivia de ouvido grudado no seu radinho, ele sempre foi uma pessoa fantástica, paciente, carinhosa, de bom coração, que sabia ouvir e ajudar quem precisasse. Mas quero dizer que a sua melhor versão foi a de Pai. Agradeço todos os dias, nas minhas orações, por ter tido o privilégio de ser sua Filha, de receber seu carinho, seus ensinamentos, seus exemplos.
Tenho comigo as melhores recordações da sua mão carinhosa me fazendo cafuné, das suas conversas sempre tão calorosas, dos seus conselhos, das suas brincadeiras, do seu orgulho ao me ver seguindo os seus passos. Lembro dele dizendo, depois que fui para a Globo, que eu não era mais a "filha do Ranzolin", ele que era o "pai da Cristina". Numa das últimas vezes que pegou sozinho o telefone para me ligar, foi para me elogiar no comando do Jornal do Almoço. Hoje, por mais limitado que ele possa estar, quero dizer que ele segue me dando força, me dando paz, sendo meu Herói. Não precisamos trocar palavras, nem olhares, nos comunicamos em outra sintonia.
Como sempre trabalhou desde muito jovem, tinha planos de se aposentar para viajar e curtir os netos, mas também dizia que queria escrever um livro com sua história e do rádio gaúcho. Quando tentou, a memória já não ajudou, mas tenho certeza de que quem o ouviu jamais esquecerá aquele timbre de voz, aquelas palavras certas na hora certa, aquele entusiasmo no ar, aquele amigo que - agora vocês sabem - segue lutando pela vida!
*O colunista David Coimbra está em férias - CRISTINA RANZOLIN INTERINA
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