quarta-feira, 8 de dezembro de 2021


08 DE DEZEMBRO DE 2021
MÁRIO CORSO

Falta energia

Em uma entrevista, perguntaram a Caetano Veloso se ele tinha saudade dos anos agitados e criativos da sua juventude. Ele disse que não, sentia-se melhor na maturidade. Porém, tinha saudade da energia de que dispunha na mocidade. Sábias palavras, vamos melhorando, mas a energia já não é a mesma.

Energia é uma palavra de uma simplicidade enganosa, do que mesmo estamos a falar? Certamente entendemos o que Caetano disse, mas uma nuvem de imprecisão cerca o conceito. Esta energia é corporal ou anímica? De onde vem? Por que declina com a idade? Como podemos incrementá-la?

A dificuldade reside em que a tal energia, na falta de um termo melhor, está na intersecção entre o que seria a mente e o corpo. Ela não está em um nem no outro, mas na dobradiça onde os dois giram para fazer o que somos. A ideia de energia escancara nossa inexatidão conceitual a esse respeito.

A princípio, essa precisão parece banal, mas é decisiva na maneira como vamos entender e enfrentar os problemas de um enfraquecimento da energia vital. Por exemplo, pensamos a depressão como um problema anímico, como uma doença da vontade, da esperança. Até pode ser certo como disparador, mas o corpo está envolvido na toxicidade depressiva.

A questão me atravessa pelo meu quadro de covid longa. Saí da doença com fadiga crônica. Aliás, o mais comum entre os sintomas residuais de quem passou por isso. Depois da covid, nosso corpo fica avariado, dores por todos lados e a energia vital a quase zero. Vamos melhorando aos poucos, mas a fadiga resiste a ir embora. Mal comparando, é como se fosse uma depressão somática. O corpo pesa toneladas, todo agir é custoso, economizamos qualquer movimento. Queremos reagir, mas o corpo responde mal.

A fadiga crônica é uma experiência desconcertante: estamos cansados por nada. Inútil descansar, acordamos iguais. A fadiga não responde à lógica do desgaste que cobra o preço do excesso. Paradoxalmente, a única coisa que ajuda é movimentar-se. No meu caso, só o que reajusta um pouco a energia é a rotina de exercícios. Os médicos insistiram nesse ponto e tinham razão. Agora sou uma alma de Garfield levando vida de atleta.

Passei a entender melhor os velhos caseiros e pacatos. Não necessariamente estão deprimidos ou fobicamente entocados, apenas há menos energia disponível no sistema. A experiência da fadiga crônica é de uma velhice extemporânea.

Existem outros como eu por aí, com a bateria baixa por causa da covid. Quero aproveitar para sair em nossa defesa. Não estamos deprimidos nem deixamos de gostar das pessoas, apenas não conseguimos aceitar convites por uma impossibilidade real. Os deuses são testemunhas do quanto queremos nossa rotina social de volta. Por enquanto não conseguimos. Nos aguardem, voltaremos!

MÁRIO CORSO

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