quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

30 DE DEZEMBRO DE 2021
CARPINEJAR

Os centavos da existência

Eu sou favorável aos momentos quebrados. Aos centavos da existência. Costumamos pensar que moeda não é dinheiro, e desperdiçamos os 10 centavos, os 50 centavos do nosso tempo. Jogamos fora, não guardamos, não damos valor. Só nos preocupamos com as notas, com o que podemos colocar na carteira ou no banco.

Queremos exclusivamente os momentos inteiros: os finais de semana, os feriados, os dias de descanso inteiramente disponíveis.

Ansiamos por nos encontrar com quem amamos nos períodos sem nenhuma preocupação, sem nenhum estresse, sem nenhuma urgência, e adiamos a nossa vida. Não somos presentes porque esperamos uma hora perfeita que nunca virá.

A idealização é adiamento. Fantasiamos uma compensação por todos os convites protelados. Projetamos sempre um cenário mirabolante, cinematográfico.

Não conseguimos cumprir o desejado, e a culpa aumenta, e a culpa nos paralisa. E, na ausência de contato, realizamos cada vez mais promessas impossíveis.

Morremos pela boca, morremos mentindo, morremos distantes: "vamos nos ver!" ou "vamos combinar algo lá em casa!".

Esquecemos de ler os livros comprados aguardando as férias, esquecemos de ler as pessoas aguardando as folgas.

Aproveite os 15 minutos, 20 minutos, para visitar alguém. Visita de médico também cura.

Em vez de sonhar com um banquete no almoço e no jantar, em vez de buscar os efeitos especiais, em vez de providenciar altos orçamentos e grandes mimos, em vez de bloquear a agenda, em vez de planejar viagens irreais, em vez de imaginar o que não tem condições devido ao excesso de compromissos, apareça para um cafezinho de surpresa. Apareça com um bolo ou um doce, apareça rindo, apareça pedindo desculpa por não avisar, apareça para colocar o cotovelo nos farelos de pão, apareça para brindar a companhia com as xícaras.

Seja mais passarinho com as migalhas no chão, e menos pássaro voando.

Priorize a imperfeição. Junte as moedas do seu cotidiano. É uma moedinha a mais para colocar no coração do outro, para depositar na confiança dos pais, dos filhos, dos amigos. Uma moedinha que não vale nada sozinha, mas que - com a frequência - formará fortuna na memória.

Não será como você imaginou, mas já será lembrança, já matará a saudade, já se mostrará acessível, perto, ao lado.

Como você vê que não tem muito tempo, deixa de fazer. Faça o possível, mas não deixe de fazer.

Nunca saberemos quando será a última vez. A despedida já pode ter acontecido.

CARPINEJAR

Nenhum comentário: