27 DE NOVEMBRO DE 2021
MARCELO RECH
Lula precisa escolher o lado
Como a devoção às democracias será um tema central da próxima campanha eleitoral, o favorito nas pesquisas precisa se decidir. Ele entende que há ditadura boa e ditadura ruim? Ele tem apreço por ditadores, desde que de esquerda? O que ele vê de bom nos sistemas políticos e nos governantes de Venezuela, Cuba e Nicarágua?
A pré-candidatura de Lula à Presidência está repleta de furos em um telhado de vidro, a começar por sua promiscuidade com empreiteiros que cresceram à sombra da corrupção na Petrobrás. Outro fantasma que seguirá o assombrando em debates e entrevistas é a hipótese de que, apesar do figurino social-democrata que tenta vestir para buscar o voto de centro, Lula representa correntes que, no fundo, acham mesmo que Daniel Ortega está certo em mandar sete candidatos da oposição para a cadeia na Nicarágua porque “são filhos da cachorra do imperialismo ianque”.
Lula pode se iludir com o fato de desfrutar de uma ampla base de simpatizantes que o aplaudem em quaisquer circunstâncias. Jair Bolsonaro é frequentemente ovacionado em suas andanças – mas essas manifestações não concedem ao presidente o direito de se associar a governos totalitários, intimidar opositores e a imprensa ou falar asneiras impunemente. Como líder nas pesquisas e potencial futuro ocupante da Presidência, Lula, portanto, também tem de dar muitas explicações sobre suas convicções e conexões, o que inclui as ditaduras esquerdistas da América Latina.
Para além dos contorcionismos verbais, no que é um mestre, Lula precisa esclarecer até onde vai sua ligação com o castrismo em Cuba e o chavismo na Venezuela. Vá lá que Lula e a namorada tenham escolhido Havana, onde gravaria um documentário, para passar o Réveillon passado – e lá tenha sido diagnosticado com covid, aliás. Ou que os contribuintes tenham bancado R$ 163 mil dessa viagem.
O custeio oficial do tempo livre de ex-presidentes devia ser revisto, mas, por enquanto, é seu direito curtir a vida usando dinheiro público. Também não seria o caso se imiscuir nas admirações platônicas do cidadão Lula com regimes de força. Trata-se de entender a profundidade da relação de um potencial futuro presidente com ditaduras, até porque os governos petistas usaram e abusaram dos cofres estatais para solidificar os vínculos com os governantes de Cuba e Venezuela.
Uma coisa é manter relações diplomáticas com autocracias – a África, o Oriente Médio e a Ásia têm constelações delas – e o Brasil não pode deixar de fazer negócios nestes países. Outra, bem diferente, é dar apoio político e econômico a déspotas, sejam eles de esquerda ou direita, endossando torturas, prisões políticas, censura à imprensa, proibição de manifestações e deportação de opositores. Com ditaduras não há meio termo. De que lado Lula ficará?
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