sábado, 13 de novembro de 2021


13 DE NOVEMBRO DE 2021
MARTHA MEDEIROS

Tanto tudo

Você sabe que os anos estão passando quando não identifica mais quem são as pessoas que a maioria da população admira. Há um sem-número de ídolos populares que, se entrassem num elevador comigo, eu não faria ideia de quem seriam, enquanto, para seus fãs, compartilhar com eles os poucos segundos entre o térreo e o décimo andar ressignificaria a vida. Muitos artistas estão neste exato instante quebrando recordes no Spotify e fazendo lives acompanhadas por milhões de seguidores, e ao ouvir seus nomes pela primeira vez, eu talvez os confundisse com algum ex-colega de faculdade.

Parece absurdo que alguém nunca tenha escutado a respeito de Anitta, por exemplo, mas há pouco tempo, um advogado me perguntou quem era. Fiquei chocada. De que planeta você veio? Pode-se gostar ou não gostar, mas jamais ter ouvido falar de Anitta? Só então me dei conta de que eu estava caindo na armadilha comum de achar que, se alguém ignora a existência de uma celebridade, não passa de um esnobe.

O showbiz mudou. Antigamente, as capas de revista consagravam carreiras. A televisão era o eletrodoméstico mais importante da casa. Todo mundo conhecia o rei do iê iê iê, o galã da novela, a miss de cetro e coroa. Eram intocáveis, distantes, quase sobrenaturais - pois raros.

Hoje você grava um vídeo caseiro, posta na internet, cai na graça de uns, viraliza e dentro de um ano pode estar morando numa mansão, e quem vai dizer que o valor passou ao largo? Quase sempre o êxito vem do talento artístico, mas pode vir também do faro para tendências, para criar conteúdo motivacional, para fazer dinheiro nas redes - algum talento toda pessoa tem, é só descobrir qual e como usá-lo, manejando as ferramentas que dispõe. A frase célebre de Andy Warhol não caducou pelo sentido, e sim pela duração: 15 minutos, hoje, é uma eternidade, mas uns poucos segundos de visibilidade estão garantidos a todos.

Nós, os sobreviventes da era analógica, não conseguimos acompanhar tanta novidade circulando pelo palco digital. Eu, ao menos, admito a lentidão que me domina: cultivo paixões antigas e algumas atuais, e já me perdoei por, mesmo trabalhando num veículo de comunicação, não conseguir estar informada sobre tudo e sobre todos. Não conhecia Marilia Mendonça. De que planeta eu vim?

De outro século e deste aqui, vim lá de trás e de hoje cedo, administro como posso o meu passado e este presente intenso, me espanto com a oferta atordoante de eventos e existências, tantas que nem todas são por mim assimiladas. Ainda assim, junto-me aos lamentos. Toda morte é trágica, ainda mais de jovens que deixam órfãos uma família, amigos, fãs e um futuro. Não é esnobismo, não, é esse tempo agora, voraz.

MARTHA MEDEIROS

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