sexta-feira, 22 de setembro de 2023


22 DE SETEMBRO DE 2023
CELSO LOUREIRO CHAVES

Tempestades musicais

Catástrofes, calamidades, enchentes, destruição. O mês de setembro tem sido cheio de acontecimentos que comprovam, na prática, a agressão generalizada ao meio ambiente denunciada com frequência pelos especialistas. Enquanto a recuperação do que foi levado pelas águas segue seu caminho lento, a respiração quase fica em suspenso à espera do que virá a seguir.

A música de concerto tem algo a dizer sobre isso? Provavelmente, não muito. Não por falta de meios, mas por escolha de temas para musicar. Assim como os conteúdos da música vão se alterando com o tempo, também os temas passam de uma coisa para outra, sem olhar para trás. Talvez a grande época ecológica da música de concerto tenha sido o século retrasado, onde musicar ("pintar") a natureza era marca da época.

Foi naquele momento longínquo da música de concerto que os compositores se preocuparam em colocar em som os fenômenos devastadores das grandes chuvas, as tempestades enormes, a diminuição do humano diante de acontecimentos sem controle. Um exemplo bem conhecido e ainda tocado com gosto é a Sexta Sinfonia de Beethoven, com sua intempérie que invade o quarto movimento para arrastar colcheias e semicolcheias.

Beethoven é o modelo para as tempestades musicais do século 19, quando a música descritiva estava na ordem do dia e as preocupações ecológicas também não ficavam atrás em interesse. É disso que se trata: descrever algo, colocar em música aquilo que de alguma maneira se possa relacionar com a realidade. Seja na tempestade que abre a ópera Otelo de Verdi ou na que abre A Valquíria de Wagner.

Até mesmo fenômenos muito mais pacíficos serviram como tema musical: um nascer do sol em Assim Falou Zaratustra de Strauss ou a melhor de todas as alvoradas, a própria Alvorada do último ato de O Escravo de Carlos Gomes. A música do século 19 está cheia de descrições sonoras da natureza, tanto quanto a pintura e seus muitos exemplos. Naqueles tempos, às vezes música e artes visuais andavam de mãos dadas.

Tomando Beethoven como exemplo de tempestade musical, é bom atentar para um detalhe nada irrelevante. A tempestade é seguida pela calmaria, pela luminosidade, levando tudo - e a Sexta Sinfonia - a bom termo, remetendo a calamidade à memória. Embora seja música do século 19, talvez esteja aí uma mensagem de esperança, algo que - enfim - a música tenha a dizer sobre os nossos dias turbulentos.

CELSO LOUREIRO CHAVES

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